Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

segunda-feira, 16 de julho de 2012

O peregrino sobre o mar de névoa~


Natureza Moral da Terapia Espírita

Kardec adverte quanto às relações da moralidade do médium com a sua mediunidade. 

Considerada em si mesma como um campo de produção de fenómenos, a mediunidade não depende da moralidade. 

Mas considerada como instrumento cognitivo, ou seja, como meio de conhecimento, a mediunidade depende estritamente da moralidade. 

Sacerdotes e religiosos de várias seitas aproveitaram-se dessa declaração de Kardec para acusar o Espiritismo de doutrina sem moral. Revelavam com isso apoucada inteligência e falta de moral. 

Essa observação de Kardec comprovou-se amplamente nas pesquisas espíritas e nas sociedades de pesquisa psíquicas da Europa e da América. A tese é límpida e precisa. Os fenómenos mediúnicos, como os fenómenos físicos, não dependem da moral do médium ou do físico. 

O químico de vida moral mais condenável produz as suas reacções químicas em laboratório sem pensar na moral. Mas quando se trata da busca da verdade ou de processos de cura, a mediunidade divorciada da moralidade não serve, tornando-se mesmo perigosa. A eficácia da terapia espírita depende da integridade moral do médium que lhe serve de instrumento. Esse é um problema de relações humanas no plano das sintonias espirituais.

Desejando acelerar os trabalhos de ordenação da doutrina, na Codificação – no qual trabalhava apenas com as meninas Boudin – Kardec pensou em utilizar-se da boa-vontade de um médium seu conhecido, mas o seu orientador espiritual o advertiu de que esse médium não tinha condições morais para o trabalho, acrescentando: “A verdade não pode falar pela boca da mentira.” Desse episódio, bem como dos princípios morais da doutrina, ampla e minuciosamente explanados na Codificação, nunca se lembraram nem se lembram os clérigos e materialistas acusadores da suposta amoralidade espírita. Bastaria isso para mostrar a debilidade moral desses acusadores.

Na terapêutica espírita, como nas investigações científicas da mediunidade, a exigência da moral é de importância básica. As constantes denúncias de fraudes mediúnicas nas pesquisas decorrem da falta de escrúpulo dos pesquisadores na escolha de seus instrumentos mediúnicos, no tocante às exigências morais.

No caso de médiuns realmente moralizados as denúncias de fraude são geralmente falsas. Costuma citar-se o caso do médium escocês Daniel Douglas Home, que produzia os fenómenos mais espantosos, como a sua própria levitação e materializações sucessivas e contra o qual só houve acusações sem base nem sentido. A famosa médium Ana Prado, no Pará, cruelmente combatida e caluniada por um clérigo fanático, saiu ilesa de todas as invencionices como Anésio Siqueira, Urbano de Assis Xavier, Luiz Parigot de Souza e tantos outros mantiveram-se sempre incólumes de acusações dessa espécie, defendidos por seu comportamento moral, que lhes garantia permanente protecção das entidades espirituais superiores. A moral do médium é o seu escudo em todas as circunstâncias. Não a moral social, que pode ser avaliada de fora e não raro de maneiras contraditórias, mas a moral íntima, pessoal, endógena, ou seja, que nasce da sua própria consciência e não precisa de sanções externas. Essa moral legítima, vivencial, garante a sintonia espiritual do médium com os espíritos elevados – única verdadeira garantia da eficácia de sua terapia. É do próprio Evangelho de Jesus que ressalta esse princípio da moral espírita.

Fala-se muito da importância da fé nas curas espirituais de qualquer sector religioso. A fé se revela, nesses casos, mais como um anseio ardente de cura do que propriamente como fé. O conceito vulgar de fé tem por fundamento a crença. Quem não crê, não tem fé. Mas, como explicou Kardec, a fé verdadeira não prescinde da razão, que a fundamenta no conhecimento e no saber. A fé espírita é racional. A crença é apenas uma aceitação emotiva de um princípio ou de um mito. Herbert Bradley, depois de suas experiências espíritas, sustentava: “Eu não creio, eu sei.” Na terapia espírita a fé representa apenas um estímulo moral ao paciente, para que ele se predisponha melhor, emocionalmente, à acção dos elementos curadores. Kardec acentuou a existência de dois campos da fé, assim divididos: fé humana e fé divina. O homem que confia em si mesmo para as suas realizações fortalece-se na fé humana. Mas aquele que possui a fé divina, resultante do seu conhecimento dos poderes da divindade, dispõe da máxima firmeza na busca dos seus intentos. Na terapia espírita essa fé não se funda nos elementos rituais das religiões, concentrando-se na sintonia do seu pensamento e dos seus sentimentos com as entidades espirituais socorristas.
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José Herculano Pires, Ciência Espírita e suas implicações terapêuticas, 3 
Natureza Moral da Terapia Espírita 1 de 3, 8º fragmento da obra
(imagem: O peregrino sobre o mar de névoa, por Caspar David Friedrich)

1 comentário:

palavra luz disse...

Caros lugar@zul e visitantes,

Esta questão fundamental da "exigência moral" e que aqui se encontra resumida mas claramente fundamentada, atravessa toda a filosofia espírita e - "por supuesto" - toda a arquitectura e a lógica da própria Criação!...

Isso faz-me lembrar algumas trocas de impressões um pouco precipitadas que tenho travado com alguém da área dos espiritualismos mercantilistas, que me repete de forma um tanto cansativa, que "o espiritismo está ultrapassado".

Esta ideia peregrina releva de uma "facilidade" geralmente proposta aos "aderentes" (ou clientes?...) dessas tendências, pelas entidades promotoras respectivas, no que toca à inexistência do MAL e suas consequências inevitáveis, e no que toca à DOR como elemento purificador da alma!...

O tema é vasto, mas de fundamental importância na compreensão aprofundada e essencial de alguns princípios basilares da nossa doutrina.

Por isso se pode dizer que a mesma não está desactualizada de forma alguma. COMO NÃO É COMÉRCIO, o espiritismo, não tem que "facilitar" a vida aos potenciais candidatos à doutrina, escondendo-lhes as verdades fundamentais naquilo que toca à absoluta igualdade de tratamento de todos os seres e consequente justiça nos percursos inevitáveis da evolução.

Donde a lógica inevitável do mais estrito respeito pelas questões de natureza moral que são pano de fundo universal destas, como de todas as questões da vida, do conhecimento e exercício da mesma.

A consciência moral, o entendimento do MAL como inerência do livre arbítrio e a resignação perante a DOR, coisas fundamentais de uma CULTURA DE SERIEDADE e que, aceito perfeitamente, não sejam muito vendáveis...

Fraternas saudações e votos de elevação moral, que é uma estrada inclinada quanto baste mas acessível a qualquer um, mas que nos dirige em segurança à FELICIDADE PERFEITA e à LUZ SEM LIMITES...