Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

domingo, 1 de julho de 2012

O Génio Céltico e o Mundo Invisível~


CAPÍTULO III

O País de Gales. 
A Escócia. 
A obra dos bardos

Os galeses, em geral, acreditavam firmemente no mundo dos espíritos e nas suas manifestações. Eles apresentam, às vezes, nomes e formas muito fantasiosas para isso. Seus relatos deixam uma grande margem para a imaginação. Entretanto, do conjunto dos factos relatados se deduz uma série de testemunhos que não saberíamos recusar.

Por exemplo, no que se refere aos “espíritos batedores da mina”, esses seres invisíveis que, por seus golpes surdos, prolongados, repetidos, encorajam os mineiros e dirigem suas pesquisas em direcção aos melhores filões; eis o relatório redigido, sobre esse assunto, pelo engenheiro Merris, homem muito estimado pelo seu saber e sua probidade, publicado na revista Gentleman’s Magazine:

“As pessoas que não conhecem as artes e as ciências ou o poder secreto da natureza zombarão de nós, mineiros de Cardigan, que acreditamos na existência dos “batedores”. Eles são uma espécie de génios bons, mas inapreensíveis, que não se vêem, mas se ouvem, e que parecem trabalhar nas minas, isto é, que o “batedor” é o representante ou o precursor do trabalho nas minas, como os sonhos o são de certos acidentes que acontecem.

Quando foi descoberta a mina de Esgair y Myn, os “batedores” nela trabalharam activamente, noite e dia, e um grande número de pessoas os ouviram. Mas, após a descoberta da grande mina, não foram mais ouvidos. Quando comecei a explorar as minas de Elwyn-Elwyd, os “batedores” agiram tão fortemente, durante um certo tempo, que assustaram os jovens operários. Quando removíamos as camadas de rochas, antes de chegar no mineral, é que os ruídos se fizeram mais fortes; eles cessaram quando nós atingimos o mineral.

Sem dúvida, nossas asserções serão discutidas. Afirmo, entretanto, que os factos são reais, mesmo que não possa nem pretenda explicá-los. Os cépticos podem sorrir; quanto a nós, mineiros, continuaremos a nos alegrar e a agradecer aos “batedores”, ou melhor, a Deus, que nos envia seus conselhos.”

Os fenómenos de assombração não são raros no País de Gales. Cita-se de bom grado tal casa ou tal castelo que os conheceram e suportaram. O Sr. Le Goffic, na sua viagem a Cardiff como delegado bretão à grande Assembleia solene de 1899, recolheu uma grande série de relatos desse género, que ele publicou no seu livro L’Âme Bretonne (A Alma Bretã).

A maioria desses relatos nos parecem muito marcados de superstição. Cremos, portanto, que devemos indicar um testemunho sério, o de Lady Herbert, ilustre patriota galesa, descendente dos antigos reis “kymris”, que recebia a delegação no seu castelo de Llanover.

O Sr. Le Goffic cita a conversa que teve sobre esse assunto com essa grande dama:

“O exemplo vem do Alto. Não se diz na Inglaterra que a própria rainha tem seu fantasma que ronda os apartamentos de Windsor? E esse fantasma, vestido de negro, não é outro senão a grande Elisabeth.

O lugar-tenente Glynn, de guarda na biblioteca, percebeu como o fantasma penetrou no quarto contíguo. Ora, esse quarto não tinha saída, mas tivera uma, outrora, durante a vida de Elisabeth, e que foi fechada depois. O lugar-tenente correu atrás do fantasma e chegou justo a tempo para vê-lo introduzir-se na parede. O facto se reproduziu diversas vezes e o temor foi tão grande, em Windsor, que foi preciso dobrar a guarda da noite.

Windsor tem sua dama negra, meu castelo de Cold Brooks tem sua dama branca. Vós perguntais qual o sentido dessas aparições? Ora, como a igreja nos explica, são almas em sofrimento que pedem piedade dos vivos esquecidos. Os outros espectros têm a função de avisadores. É o caso, creio, da dama negra de Windsor: sua presença anuncia sempre algum facto grave, uma guerra ou catástrofe próxima.

Os avisos, ou como vós dizeis na Bretanha, os “intersignos”, revestem todas as formas. Algumas vezes essas formas são especiais para certas famílias. Os Grey de Ruthwen são avisados da morte de seus membros pela aparição de uma carruagem, com quatro cavalos negros.

A família Airl, quando um dos seus membros está perto da hora da morte, ouve um rufo de tambor. Em um jantar, estando presente um desses Airl, alguém lhe perguntou como passatempo: “Qual é, então, o ‘intersigno’ de sua família?” – “O tambor”. E, como para atestar o facto, um rufo, surdo e velado, soou ao longe. Lord Airl empalideceu; algum tempo depois, um mensageiro veio anunciar que um dos membros de sua família estava morto.

Os Mac-Gwenlyne, descendentes do célebre clã desse nome, possuem há séculos, no norte da Escócia, o velho solar de Fairdhu: uma grande abóbada curvada lhe dá o acesso, e julga-se que a pedra que serve de base para essa abóbada começa a tremer quando um Mac-Gwenlyne vai morrer...” 

Os casos de castelos e lugares assombrados são tão numerosos na Escócia que deixamos de citar todos. Sabe-se que esse país é a terra clássica dos videntes, dos fantasmas e dos espíritos familiares. O aspecto melancólico de suas regiões, cobertas de neblina, e de suas ruínas presta-se às visões e às evocações.

Ainda em nossos dias, a sombra de Marie Stuart não apareceu a Lady Caithness, Duquesa de Pomar, na capela real de Holyrood, onde se alinham os túmulos dos reis da Escócia? Em sua sumptuosa casa da rua Brémontier, em Paris, em dias de reuniões psíquicas, a duquesa se comprazia em nos contar sua palestra nocturna com a infortunada rainha.
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LÉON DENIS, O Génio Céltico e o Mundo Invisível, Primeira Parte OS PAÍSES CÉLTICOS, CAPÍTULO III – O País de Gales. A Escócia. A obra dos bardos 2 de 3, 12º fragmento.
(Imagem: A Apoteose dos heróis franceses que morreram por seu país durante a guerra da Liberdade, pintura de Anne-Louis Girodet-Trioson)

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