Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

quinta-feira, 25 de julho de 2013

O Génio Céltico e o Mundo Invisível ~


Capítulo VI

A Lorraine e os Vosges. Joana d’Arc, alma céltica

   Por quê estas páginas sobre a Lorraine? – pergunta-se. Esta região, afastada de todos os grandes focos célticos, pode então figurar na sua sequência? Sim, certamente, porque a Lorraine sempre tem sido o baluarte de defesa do mundo céltico contra os germanos.

   Demais, deve notar-se que existe uma lacuna em quase todas as obras similares. Fala-se muito da Bretagne e passa-se em silêncio sobre as outras regiões célticas. Ora, para facilitar, na França, o despertar da alma céltica, reconduzi-la às suas tradições, mostrar a altivez de suas origens, é preciso lembrar a sua ascendência sobre outras províncias interessadas e desembaraçá-las, assim, dessa influência latina que, desde muitos séculos, dissimula a sua própria individualidade.

   A Lorraine foi, constantemente, o caminho de invasões dos povos vindos do norte atraídos pelos eflúvios das regiões quentes ou temperadas. Desde os primeiros tempos de nossa história, longa seria a lista das hordas estrangeiras que têm pisado o seu solo e devastado os seus campos. Toda a minha infância foi embalada pelo relato das depredações causadas pelos exércitos inimigos. À sua aproximação, os habitantes das aldeias, levando o que tinham de mais precioso, fugiam para os confins dos bosques onde erguiam as barracas, às pressas. Igualmente, enquanto que, no centro e no oeste, os sítios e as habitações estão disseminados aqui e ali, conforme as necessidades da cultura, é notável de ver, no leste, as populações agrupadas em grandes vilas; as casas isoladas, ali, são raras. De todos esses fluxos e refluxos de exércitos, desses cercos e choques violentos, a Lorraine sofreu mais do que qualquer outra província francesa. Isso motivou um patriotismo ardente que persiste através dos séculos.

   A cadeia dos Vosges se ergue como uma muralha, da qual o Reno parece ser o fosso. A planície da Alsace é misturada de elementos gauleses e germânicos, mas por toda a parte, as lembranças célticas dominam. O mesmo ocorre em alguns outros pontos da Lorraine.

   Como um posto avançado cobrindo a linha dos montes, o Odilienberg eleva bem alto, acima dessa planície, o seu campo entrincheirado, formado de blocos ciclópicos, enorme recinto que podia servir de refúgio e de defesa a uma tribo inteira com todos os seus recursos em grãos, rações e animais.

   Sobre duas elevações, ocupadas hoje em dia por duas capelas, se achavam os templos de Hésus e de Bellena. O Donon, como o Puy de Dôme, era uma montanha consagrada aos deuses, e sobre quase todos os cumes dos Vosges se encontram vestígios de altares druídicos.

   Eu andei, frequentemente, sobre essas cristas e esses planaltos encrespados de carvalhos, de faias e de negros abetos entre os rochedos de arenito vermelho e de ruínas de velhos burgos, pousados como ninhos de águia sobre os altos cumes.

   A qual época remonta o vasto sistema de defesa que, sob o nome de “muro pagão”, abarca as alturas de Sainte-Odile, a Bloss e o Menelstein? Evidentemente, à época das primeiras invasões germânicas, as quais ele tinha, por finalidade, deter ou retardar. Esses entrincheiramentos pertenciam, portanto, ao período céltico.

   Maurice Barrès escrevia sobre esse assunto:

   “Nessa montanha, desde o século IV ou III a.C., os celtas tinham construído o “muro pagão”. Encontram-se sobre esse cume os restos de um “oppidum” (fortaleza) gaulês e provavelmente um colégio sacerdotal druídico.” (I)

   Escreveu, por sua vez, Edouard Schuré:

   “Os “tumuli” (montes de pedras, espécie de túmulos) encontrados no recinto, os menires posados sobre os flancos, os dolmens e as pedras de sacrifício que se espalham pelas montanhas e vales ao redor, os nomes de certas localidades, tudo prova que a montanha Sainte-Odile foi, nos tempos célticos, a sede de um grande culto.” (II)

   Esse autor, portanto, considera esse prodigioso conjunto de ruínas como os restos de um dos maiores santuários da Gália. Ele coloca sobre o promontório de Landsberg o “Templo do Sol”, usado pelos druidas. Desse ponto o panorama é imenso, estendendo-se para trás sobre as vastas florestas e vales encaixados que cobrem as vertentes dos Vosges e em direcção oposta, sobre toda a planície da Alsace. De longe, a fita prateada do Reno se desenrola; finalmente, no horizonte, por cima das arestas sombrias da Floresta Negra, a vista se estende até aos cumes dos Alpes, deslumbrante, sob a sua coroa de geleiras.

   Pode notar-se, como fizemos a propósito da Bretagne, que a maior parte dos grandes santuários cristãos foram adaptados, poder-se-ia dizer, foram enxertados sobre cultos anteriores.

   Nos terrenos consagrados pelos druidas durante séculos foi construído, mais tarde, o Mosteiro de Sainte-Odile, padroeira da Alsace.

   Apesar da mudança de religião, desde dois mil anos, longas filas de peregrinos se encaminhavam para a “Montanha do Sol”, para ali procurar um socorro moral. Sob nomes e fórmulas variadas, a sua fé, as suas orações a ela os atraíam e nela acumulavam essas forças psíquicas das quais a ciência começa apenas a medir a potência e a extensão. Eles criavam, assim, um ambiente fluídico e magnético que permitia ao mundo invisível se reaproximar do mundo terrestre e agir sobre ele. Daí, essas manifestações e principalmente essas curas maravilhosas que se produziram nos lugares sagrados de todos os tempos, de todos os países e de todas as religiões.

   No seio desses sítios grandiosos, o pensamento se eleva com mais força, comunga com mais intensidade com o Além superior, porque Deus está por toda parte onde a natureza fala ao coração do homem.

   Quando um tremor passa sobre as massas de verde e faz ondular o cume das grandes árvores da floresta, quando a voz das torrentes e das cascatas se eleva do fundo dos vales, a alma iniciada compreende melhor a beleza eterna, a suprema harmonia das coisas, e vibra em uníssono com a vida universal. É o que eu senti não somente sobre as alturas de Sainte-Odile, mas também sobre a maior parte dos cumes dos Vosges e, notadamente, sobre o Hohneck, de onde a vista engloba toda a planície até ao Reno, até aos Alpes longínquos.

   Dia virá em que os homens, afastando-se das velhas formas religiosas, se unirão num pensamento comum de adoração e de amor. Como no tempo dos druidas, a natureza retornará ao templo augusto; será então a religião do espírito, consciente dele mesmo e de seu destino, que é o de evoluir de vidas em vidas, de mundos em mundos em direcção ao foco eterno de toda luz, de toda sabedoria, de toda verdade. E assim será fundada a unidade religiosa da Terra e do espaço, de duas humanidades, visível e invisível.
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(I) Maurice Barrés, Au service de l’Allemagne, cap. VI.
(II) Les Grandes Légendes de France. Ed. Perrin.


LÉON DENIS, O Génio Céltico e o Mundo Invisível, Primeira Parte OS PAÍSES CÉLTICOS, CAPÍTULO VI – A Lorraine e os Vosges. Joana d’Arc, alma céltica 1 de 3, 19º fragmento da obra.
(imagem: A Apoteose dos heróis franceses que morreram pelo seu país durante a guerra da Liberdade, pintura de Anne-Louis Girodet-Trioson)

sexta-feira, 19 de julho de 2013

O peregrino sobre o mar de névoa ~


Motivos de Dificuldades nas Curas (II)

Passar de um tipo de mentalidade a outro, no processo histórico, exige enorme e persistente esforço de uma civilização. Num momento agudo de transição como enfrentamos no nosso tempo, esse processo exige modificações violentas que provocam medo e inquietação. O homem actual perdeu a segurança do passado. As suas próprias certezas científicas foram substituídas por probabilidades. Ele se recusa inconscientemente a trocar os seus mitos religiosos por ideias racionais, mas ao mesmo tempo sente-se obrigado a trocá-los, por força do desenvolvimento cultural e tecnológico. O antropomorfismo, que o cevou por milénios nas ideias cómodas de um Deus semelhante a ele e o fez familiar a Deus, é para ele muito caro. Deixar esse Deus familiar pela ideia de uma Consciência Cósmica confunde-o. Como Kardec acentuou, esse processo se torna fácil graças à sucessão das gerações. Já podemos notar o enfraquecimento dos mitos actuais no decorrer dos anos. Toynbee mostrou que as civilizações se apoiam no alicerce das grandes religiões, confirmando a influência da lei de adoração no processo histórico. Não se referiu a essa lei de kardec, mas reconheceu a sua necessidade básica para a evolução mental e espiritual das comunidades humanas. Esse é hoje um tema pacífico. As grandes ideologias revolucionárias, por mais brutais que fossem, acabaram sempre por se estruturar nas formas de religiões, não podendo vingar sem essas metamorfoses significativas. O Positivismo de Comte desembocou, para espanto dos seus adeptos mais fiéis, na Religião da Humanidade; os ideólogos da Revolução Francesa entronizaram a Deusa Razão na Catedral de Notre Dame, o Marxismo converteu-se numa organização fanática de salvacionistas, com a adoração de Marx entre a foice e o martelo, a reverência aos ídolos sagrados da Revolução Bolchevista e a obediência servil às bulas papais do Kremlin ressuscitado das cinzas. Mas tudo isso foi precedido de longas e dolorosas metamorfoses conceptuais. A pretensão científica do materialismo Dialéctico foi asfixiada pela falência da matéria no desenvolvimento da Física Moderna. Todas essas tentativas de religiões artificiais esboroaram-se, abrindo passagem à lógica realista e irrefutável da concepção espírita, inteiramente livre de símbolos e mitos que favorecem o desenvolvimento de novos formalismos e de novos mitos. Monsenhor Pisoni, expert de Espiritismo no Vaticano, declarou recentemente à revista italiana Gente que teve a oportunidade de receber mensagens autênticas de dois amigos falecidos, e acrescentou que o Vaticano não condena as pesquisas espíritas. Já chegou à cúpula do mundo católico o abalo inevitável das velhas estruturas. Cabe-nos agora vigiar activamente, aprofundando os estudos doutrinários do Espiritismo, para que a metamorfose conceptual em curso não arraste os espíritas para a voragem das deturpações sincréticas. Só um esforço conjunto dos intelectuais espíritas poderá impedir a ameaça desse novo naufrágio da razão no misticismo formalista e mitológico dos criadores de mitos. A terapia espírita, natural e simples, seria então sufocada por um retorno de séculos à adoração espúria das fantasias.

Estamos num desses vórtices perigosos da história, em que os acidentes dessa espécie são comuns, por falta de conhecimento real das doutrinas renovadoras. Precisamos de aprofundar os estudos doutrinários, através do esforço de pensadores espíritas suficientemente integrados na cultura actual e empenhados no desenvolvimento da nova cultura da era cósmica.

Temos de dinamizar os nossos esforços na elaboração consciente e esclarecida da Cultura Espírita, única realmente dotada de capacidade para absorver os elementos válidos da cultura leiga. As culturas, como ensina Ernst Cassirer, nascem e se desenvolvem por esse processo de assimilação selectiva (não sincrética) da herança cultural anterior. Se os espíritas não compreenderem essa necessidade histórica e não se prepararem para enfrentá-las, serão os responsáveis pelo retrocesso ao misticismo obscurantista que já nos ameaça.

Kardec insistiu na necessidade de nos firmarmos na razão para não recairmos nos delírios da imaginação excitada pelo impulso de sublimação que levou os clérigos de todos os tempos a se julgarem privilegiados de Deus e agraciados pela sabedoria infusa do teologismo. A imaginação, como observara Descartes, leva-nos a romper os limites do possível. Nada mais apropriado para transformar e acelerar de repente os passos cautelosos na disparada quixotesca. Por isso, o campo do paranormal oferece mais dificuldades para a pesquisa científica do que o dos fenómenos físicos. Myers advertiu que a mente subliminar se destina à vida espiritual e não à material, que corresponde às exigências imediatistas do mundo sensorial. Kardec esquivou-se ao uso dos processos da vidência e do desprendimento mediúnico para a investigação do plano espiritual, preferindo obter informações dos espíritos, sempre que controláveis, para atingir a verdade sobre o outro mundo. Alegava que os que vivem naquele mundo estão mais aptos a nos fornecer dados sobre ele. O espírito encarnado está condicionado ao nosso plano, mas o desencarnado condiciona-se ao outro. Cabe à razão humana, através de pesquisas adequadas – hoje comuns nas ciências do extra-físico – verificar as possibilidades lógicas das informações e proceder às verificações necessárias à comprovação dos dados oferecidos pelos informantes.

Kardec considerou importante, como um dos meios de controle dessas informações do Além, o critério do consenso universal. Excluía assim os perigos da opinião individual. Qualquer revelação de um espírito teria de passar pelo teste inicial do consenso. Se outras comunicações semelhantes se verificassem por outros médiuns em outros locais, na mesma ocasião, esse consenso dava – desde que os médiuns não se conhecessem e residissem distantes uns dos outros – uma suposição de veracidade. Mas só as comprovações experimentais poderiam legitimá-las. As suas pesquisas eram árduas e minuciosas, mas os resultados foram tão positivos que nenhum dos princípios por ele estabelecidos foi abalado pela evolução científica dos nossos dias. Pelo contrário, permanecem como antecipações de solução para problemas com que lutam ainda os pesquisadores actuais. Por exemplo: a sua afirmação de que o corpo espiritual é semimaterial, aplica-se hoje ao corpo bioplásmico, que é formado de plasma físico, mistura de partículas atómicas, em que se inserem elementos extra-físicos. O próprio ectoplasma, que Ímoda, Richet e Fontenai, em pesquisas conjuntas, com a mediunidade de Linda Gazzera, na Itália, verificaram ser tridimensional, revela-se hoje, nas pesquisas russas da Universidade de Kirov, como energias do perispírito. Confirma-se assim a validade das pesquisas de Crawford em Belfast, tantas vezes ridicularizadas sem nenhuma contraprova experimental. As alavancas de Crawford, reveladas por ele como pseudópodos de massa leitosa ou jactos de energia radiante, que movimentavam objectos à distância, sem contacto, foram definidas em Kirov como emissões de energias plásmicas emitidas pelo médium para produzir efeitos materiais à distância. As pesquisas de Schrenk-Notzing, em Berlim, provaram que a massa ectoplasmática retorna ao corpo do médium, sendo reabsorvida como o são também as energias. As três dimensões do ectoplasma são: a visível, em forma leitosa, que produz formas de membros humanos e até mesmo materializações completas de espíritos de mortos; a visível, em forma de fluido esbranquiçado; e a invisível, que se pode perceber pelo tacto como uma espécie de teias de aranha finíssimas e levemente pegajosas. Zöllner, na Universidade de Leipzig, provou o poder explosivo do ectoplasma, mesmo invisível. Nos casos de cura, o ectoplasma tem funções ainda não suficientemente definidas, mas já evidenciadas em numerosas oportunidades. Fisiologistas famosos, como Geley e Richet, entenderam que pode actuar na recuperação de tecidos gastos ou acidentados.

As dificuldades de cura decorrem geralmente de implicações cármicas dos pacientes, de deficiências mediúnicas e de falta de conhecimento do problema pelos dirigentes de sessões. O apego emocional dos pacientes aos seus obsessores, por afinidades temperamentais, é um dos mais graves entraves do processo terapêutico. Os médicos espíritas podem controlar a cura e estimular os pacientes, bem como os médiuns doadores de energias ectoplásmicas. Por isso é sempre aconselhável a presença e participação de médicos conhecedores do problema em todos os tratamentos pela terapia espírita. Alegar que a participação médica torna suspeitos os resultados é simplesmente provar desconhecimento do assunto.
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José Herculano Pires, Ciência Espírita e suas implicações terapêuticas, Motivos de Dificuldades nas Curas 2 de 2, 14º fragmento da obra.
(imagem: O peregrino sobre o mar de névoa, por Caspar David Friedrich)

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Seres Radiantes do espaço ~


Capítulo III (II)

Às vezes, pergunta-se: o que distingue os raios X das ondas hertzianas? Ambos são ondulações vibratórias do éter, no primeiro caso, mais curtas e, no segundo, mais longas. Os físicos calculam que os comprimentos de onda dos raios X variam entre um milionésimo e cem milionésimos do milímetro, e a sua frequência escapa à imaginação. Esses cálculos dão uma ideia da potência da radiação das ondas luminosas que atravessam o Espaço na velocidade de trezentos mil quilómetros por segundo; a ideia dessa grande onda de forças que inundam, sem cessar, através do Espaço. E vemos, assim, que o infinitamente pequeno é tão maravilhoso na sua estrutura e nos seus efeitos, quanto o infinitamente grande, e que um como o outro se completam, se interpenetram e se identificam.

O estudo das forças radiantes nos demonstra, também, que as teorias eléctricas estão em harmonia com a lei geral da gravidade em suas duas formas, positiva e negativa, isto é, atracção e repulsão; a electricidade é somente uma das manifestações da energia universal.

Trata-se de um fenómeno inter-atómico ou inter-molecular e seu duplo aspecto resulta da condutividade ou da não condutividade dos átomos que a compõem. Conforme os espaços inter-moleculares são maiores ou mais fechados, esses elementos são condutores ou não condutores do fluido eléctrico e, de acordo com as facilidades ou a resistência que são apresentadas o fluido será positivo ou negativo.

Todas as perturbações eléctricas provêm da falta de equilíbrio dos elementos que constituem o fluido. |* Tudo se explica, então, pela diferença de densidade e de potência. As correntes etéricas determinam as correntes eléctricas, e estas provocam as correntes atómicas. Independente da pressão, os fluidos superiores agem sobre os fluidos inferiores.

Desde então, poder-se-á compreender como uma influência, exercida de modo invisível no meio etérico, pode causar os movimentos visíveis de átomos |** e, em consequência, fenómenos que parecem inexplicáveis aos não iniciados.

Nas páginas precedentes, analisamos os dados da Ciência actual sobre as forças radiantes, mas esses dados são ainda bem limitados ante o vasto problema que se relaciona, em última análise, à própria causa do Universo. Ante a nossa incompetência para tratar com grandeza desse assunto, nós nos valemos da colaboração dos invisíveis, cujos ensinamentos resumiremos:

Eles nos dizem que a matéria é apenas o agente de que o espírito se serve para realizar seus objectivos. Através de uma série de fenómenos, essa matéria pode se purificar e chegar a um estado que permite confundi-la com o princípio primordial da vida. Poder-se-ia crer que a matéria se torne espírito, porque ela é inanimada, mas nunca possui, por si mesma, um princípio próprio de vida.

A matéria vive por reflexo, segue a evolução da vida e lhe serve de suporte. A centelha que saiu do foco divino evolui na matéria, percorrendo o Espaço e volta ao seu ponto de partida, mais pura e mais luminosa.

A matéria rarefeita se transforma em fluido, em força radiante. Todo o corpo é envolvido dessa matéria fluídica; é a sua roupagem imperecível que se desprende por ocasião da morte e fica sendo o envoltório do espírito no Espaço. A matéria, vocês o sabem, é apenas uma condensação de fluidos.

Nos mundos mais adiantados do que a Terra, os espíritos mais evoluídos vivem exclusivamente dessa matéria fluídica e dela se servem para se comunicar até a grandes distâncias. Desde algum tempo, foram feitas tentativas para eles se comunicarem com a Terra.

As mensagens incompreensíveis que receberam não vinham de Marte, mas de um mundo mais elevado. Os autores dessas mensagens se lembravam de terem vivido no planeta de vocês, e entre eles estavam os seus guias espirituais que desejavam estabelecer uma comunicação e, através desse meio, enviar-lhes radiações benéficas que teriam favorecido sua evolução. Assim, se esperava influenciar a sua atmosfera, impressionar os seus cérebros e fazer funcionar os aparelhos, até então, mudos. Há outros núcleos planetários que agem também sobre vocês. As ondas chegam até vós de lados diferentes. Dessa reunião de esforços aparece um primeiro resultado: a Ciência humana se orienta para o estudo das ondas. Logo descobrirão um aparelho para registá-las, conseguirão captá-las, isolá-las e utilizar a sua força. Essas ondas terão comprimentos e velocidades superiores aos que vocês possuem. A sua electricidade é apenas um processo de isolamento, uma derivação da força universal. As ondas dos mundos a que me refiro chegarão a vós sob a forma de vibrações de uma sonoridade especial, ainda desconhecida.

Os próprios sábios incrédulos perceberão e compreenderão que essas ondas são de uma classe nova; elas serão calculáveis e veremos que os seus comprimentos são mais extensos do que os conhecidos na sua esfera.

Emissões são projectadas, sem cessar, em sua direcção; sem esse auxílio, vocês não teriam inventado a telegrafia sem fio. Esta, por enquanto, somente emite ondas de nível terrestre e que dependem de um sistema de correntes que envolvem o seu planeta. As outras ondas, que provêm de focos mais distantes, vêm chocar-se, verticalmente, com as ondas terrestres e devem atravessar as correntes paralelas que lhes fazem obstáculo. Tudo, no Espaço, se resume a ondas e em vibrações. Às vezes, nós mesmos sentimos dificuldades em nos aproximar de vós, porque somos molestados por radiações grosseiras que são originadas das paixões humanas.
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|* Segundo Max Frank: A lei de Newton é a lei única.
|** E, por extensão, o movimento Browniano, descoberto pelo botânico escocês R. Brown (1773-1858).



Léon Denis, O Espiritismo e as Forças Radiantes, Capítulo III, 2 de 4, 8º fragmento da obra.
(imagem: Anos e Anos de Viagem Sideral, pintura em acrílico de Costa Brites)

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Deus na Natureza ~


A Força e a Matéria I Posição do Problema (II)

  Há umas tantas questões profundas que, no curso da vida humana, nas horas de silêncio e solidão, se nos apresentam como outros tantos pontos de interrogação, inquietantes e misteriosos.

 Tais os problemas da existência da alma, do seu futuro destino, da existência de Deus e das suas relações com a Criação.

 Vastos e imponentes problemas, estes nos envolvem e dominam em sua imensidade, pois sentimos que nos aguardam, e na ignorância deles não poderemos razoavelmente alienar um tal ou qual temor do desconhecido.

  Assim é que, já o dizia Pascal, um desses problemas – o da mortalidade da alma – é tão importante, que é preciso haver perdido toda a consciência para ficar indiferente ao conhecimento de si mesmo. O mesmo se poderá dizer quanto à existência de Deus. Quando meditamos essas verdades, ou apenas na possibilidade da sua existência, elas nos aparecem sob aspecto tão grandioso que a nós mesmos interrogamos como podem criaturas inteligentes, seres racionais, pensantes, entregar-se uma vida inteira a interesses transitórios, sem se abstraírem uma que outra vez da sua apatia para atender a essas interrogativas preciosas.

  Se é verdade, qual o temos observado, que há neste mundo homens absolutamente indiferentes, que jamais sentiram a magnitude desses problemas, menos não é que eles nos inspiram verdadeira piedade. Aqueles que, no entanto, mais agravam a brutalidade da indiferença e, de caso pensado, desdenham alçar-se ao nível destes assuntos importantes, preferindo-lhes os doces gozos da vida material, esses, – declaramo-lo em alto e bom som – nós os deixamos sem pesar, entregues à sua inércia, para considerá-los fora da esfera intelectual.

  O problema da existência de Deus é primacial a todos. Nem por outro motivo é que, contra ele, se apontam as principais, as mais possantes baterias do Materialismo que nos propomos combater. Pretende-se provar, com a ciência positiva, a inexistência de Deus e que uma tal hipótese não passa de aberração da inteligência humana. Um grande número de homens sérios, convencidos do valor desses pretensos raciocínios científicos, enfileiraram-se ao redor desses inovadores reincidentes, engrossando desmesuradamente as hostes materialistas, primeiro na Alemanha e depois na França, na Inglaterra, na Suíça e na própria Itália.

  Ora, nós não tememos dizer que, mestres ou discípulos, quantos se apoiam em testemunhos da ciência experimental para concluir que Deus não existe, cometem a mais grave inconsequência.

  Acusando-os dessa errónea, haveremos de justificar-nos, ainda que os incriminados possam, sob outro prisma, ser considerados homens eminentes e respeitáveis. De resto, é mesmo em nome da ciência experimental que vimos combatê-los.

   Deixamos de lado toda a ciência especulativa e colocamo-nos, exclusivamente, no mesmo terreno dos adversários.

   Não pensamos como Demócrito que, vazar os olhos, para evitar as seduções do mundo exterior, seja o melhor meio de cultivar frutuosamente a Filosofia e, muito pelo contrário, permanecemos firmes na esfera da observação e da experiência.

   Nessa posição, declaramos que, por um lado, não se prende imediatamente à existência de Deus, mas, por outro lado, desde que venhamos aplicar ao problema os actuais conhecimentos científicos, longe de conduzirem à negativa, afirmam eles a inteligência e sabedoria das leis da Natureza.

   A elevação para Deus, mediante o estudo científico da Natureza, nos mantém em situação equidistante dos dois extremos, isto é: – dos que negam e dos que se permitem definir, simploriamente, a causa suprema como se houveram sido admitidos ao seu concelho. Assim, com as mesmas armas, combatemos duas potências opostas: – o materialismo e a ilusão religiosa.

   Pensamos que é igualmente falso e perigoso crer num Deus infantil, quanto negar uma causa primária.

   Em vão se nos objectará não podermos afirmar a existência de uma entidade que não conhecemos. Acautelemo-nos de presunções que tais. Certo, não conhecemos Deus, mas, sem embargo, sabemos que existe. Também não conhecemos a luz e sabemos que ela irradia das alturas celestes. Tampouco, conhecemos a vida e sabemos que ela se desdobra em esplendores na superfície da Terra.

   “Longe estou de crer – dizia Goethe a Eckermann – que tenha uma exacta noção do Ser supremo. Minhas opiniões, faladas ou escritas, resumem-se nisto: Deus é incompreensível e o homem não tem a seu respeito mais que uma noção vaga e aproximativa. De resto, toda a Natureza, e nós com ela, somos de tal modo penetrados pela Divindade que dela nos sustentamos, nela vivemos, respiramos, existimos. Sofremos ou gozamos em conformidade de leis eternas, perante as quais representamos um papel activo e passivo ao mesmo tempo, quer o reconheçamos, quer não. A criança regala-se com o bolo, sem cogitar de quem o fez, o pássaro belisca a cereja, sem imaginar como a mesma se formou. Que sabemos de Deus? E que significa, em suma, essa íntima intuição que temos de um Ser supremo? Ainda mesmo que, a exemplo dos turcos, eu lhe desse cem nomes, ficaria infinitamente abaixo da verdade, tantos são os seus inumeráveis atributos... Como o Ente supremo, a que chamamos Deus, manifesta-se não só no homem como no âmbito de uma Natureza rica e potente quanto nos grandes acontecimentos mundiais, a ideia que dele se faz é, evidentemente, exígua.”

  A ideia que os antepassados formavam de Deus, em todas as épocas, sempre esteve de acordo com o grau de ciência sucessivamente adquirido pela Humanidade. Tal como o saber humano, essa ideia é variável e deve, necessariamente, progredir, pois, seja como for, cada uma das noções que constituem o património da inteligência deve seguir a par com o progresso geral, sob pena de ficar distanciada.
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Camille Flammarion, Deus na Natureza – Primeira Parte, A Força e a Matéria I - Posição do Problema 2 de 6, 6º fragmento da obra.
(imagem: Jungle Tales_1895, pintura de James Jebusa Shannon)