Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Estudo da alma pelo magnetismo ~ Modernamente hipnotismo ~


Capítulo II

Estudo da alma pelo magnetismo ~

Acabamos de ver, no capítulo precedente, que a ideia de uma certa corporeidade, inseparável da alma, constituiu crença quase geral da antiguidade e a de uma multidão de pensadores até à nossa época.  É evidente que essa concepção resulta da dificuldade que experimentamos em imaginar uma entidade puramente espiritual. Os nossos sentidos só nos dão a conhecer a matéria e mister se torna nos utilizemos a vista interior, para sentirmos que há em nós algo mais do que esse princípio. O pensamento, por si só, nos faz admitir, dada a sua carência de caracteres físicos, a existência de alguma coisa que difere do que cai sob a apreciação dos sentidos. 

Mas, a ideia de um corpo fluídico também resulta das aparições. É manifesto que, quando se vê a alma de uma pessoa morta, forçoso é se lhe reconheça uma certa objectividade, sem o que ela se conservaria invisível. Ora, esse fenómeno se há produzido em todos os tempos e nas histórias religiosas e profanas formigam exemplos dessas manifestações do além. 

Não ignoramos que a crítica contemporânea fez tábua rasa desses factos, atribuindo-os em bloco a ilusões, a alucinações, ou à credulidade supersticiosa dos nossos avós. Strauss, Taine, Littré, Renan, etc., sistematicamente passam em silêncio todos os casos que poderíamos reivindicar. Semelhante processo não se justifica, porquanto, nos dias actuais, dados nos é comprovar as mesmas aparições e por métodos que permitem submetê-las a uma fiscalização severa. Assim sendo, assiste-nos o direito de concordar em que esses sábios se enganaram e que merecem atenção as narrativas de antanho. 

Aliás, é facto positivo que não são novos os fenómenos do Espiritismo. Produziu-se em todos os tempos. Sempre houve casas mal-assombradas e aparições.  Concebe-se, pois, que a ideia de que a alma não é puramente imaterial haja podido manter-se, a despeito do ensino em contrário das filosofias e das religiões. 

Era, porém, muito vaga, muito indeterminada a noção de um envoltório da alma. Esse corpo fluídico formar-se-ia subitamente, no instante da morte terrena? Seria para sempre, ou por tempo determinado, que a alma se revestia dessa substância subtil? Ou, então, essa aparência vaporosa seria devida apenas a uma acção momentânea, transitória, da alma sobre a atmosfera, acção destinada a cessar com a causa que a produzira? Eram questões essas que permaneceriam insolúveis, enquanto não se pudessem observar à vontade as aparições. 


A vidente de Prévorst

O magnetismo foi o primeiro a fornecer meio de penetrar-se no domínio inacessível do amanhã da morte. O sonambulismo, descoberto por de Puységur, constituiu o instrumento de investigação do mundo novo que se apresentava. Submetidos a esse estado nervoso, puderam os sonâmbulos pôr-se em comunicação com as almas desencarnadas e descrevê-las minuciosamente, de modo a deixar convencidos os assistentes de que, na realidade, conversavam com os Espíritos. 

O Dr. Kerner, tão reputado pelo seu saber, quanto pela sua perfeita honestidade, escreveu a biografia da Sra. Hauffe, mais conhecida sob a designação de A vidente de Prévorst.  Não precisava ela adormecer, para ver os Espíritos. Sua natureza delicada e refinada pela enfermidade lhe facultava perceber formas que se conservavam invisíveis às outras pessoas presentes. Teve a sua primeira visão na cozinha do castelo de Lowenstein. Era um fantasma de mulher, que ela tornou a ver alguns anos depois. 

Dizia, porém só quando a interrogavam com insistência, nunca espontaneamente, ter sempre junto de si, como o tiveram Sócrates, Platão e outros, um anjo ou daimon, que a advertia dos perigos a serem evitados não só por ela, como também por outras pessoas. Era o Espírito de sua avó, a Sra. Schmidt Gall. Apresentava-se revestida, como, aliás, todos os Espíritos femininos que lhe apareciam, de uma túnica branca com cinto e um grande véu igualmente branco. 

Declarava que, após a morte, a alma conserva um espírito nérvico, que é a sua forma. Era esse envoltório que ela possuía a faculdade de ver, sem estar adormecida e muito melhor à claridade do Sol ou da Lua, do que na obscuridade. 

“As almas, dizia, não produzem sombra. Têm forma acinzentada. Suas vestes são as que usavam na Terra, mas também acinzentadas, quais elas próprias. As melhores trazem apenas grandes túnicas brancas e parecem voejar, enquanto que as más caminham penosamente. São brilhantes os seus olhos. Elas podem, além de falar, produzir sons, tais como suspiros, ruge-ruge de seda ou papel, pancadas nas paredes e nos móveis, ruídos de areia, de seixos, ou de sapatos a roçar o solo. São também capazes de mover os mais pesados objectos e de abrir e fechar as portas.” 

Eram objectivas essas visões? Quer dizer: verificavam-se algures, que não no cérebro da Sra. Hauffe? O Dr. Kerner procedeu a muitas investigações para se certificar da realidade desses Espíritos, que só a vidente percebia. 

“Em Oberstenfald, uma dessas almas, a do conde Weiler, que assassinara seu irmão, apresentou-se à Sra. Hauffe, até sete vezes. Somente ela a viu; mas, vários parentes seus ouviram uma explosão, viram ladrilhos, móveis e candelabros se deslocarem, sem que pessoa alguma os tocasse, sempre que o fantasma vinha. 

Outra alma de assassino, vestindo um hábito de frade, perseguiu a vidente, durante todo um ano, a lhe pedir, tal qual o fizera o conde Weiler, preces e lições de catecismo. Essa alma abria e fechava violentamente as portas, removia de um lugar para outro a louça, derribava pilhas de lenha, dava fortes pancadas nas paredes e parecia brincar de mudar, a todo momento, de lugar. Vinte pessoas respeitáveis a ouviram, ora dentro de casa, ora na rua, e atestariam o facto, se fosse preciso. 

Um fantasma de mulher, trazendo nos braços uma criança, se mostrou muitas vezes à Sra. Hauffe. Como isso se desse com mais frequência na cozinha, fez que levantassem uma laje e a uma grande profundidade foi achado o cadáver de uma criança. 

Em Weinsperg, a alma de um guarda-livros, que cometera algumas infidelidades durante a vida, lhe apareceu, de sobrecasaca preta surrada, pedindo dissesse à sua viúva que não ocultasse mais os livros em que se encontravam suas escriturações falsas e indicou os lugares onde eles estavam, para que os entregasse à justiça. Ela atendeu ao pedido e com o auxílio daqueles livros foram reparadas algumas fraudes do morto. 

Em Lenach, foi a alma de um burgomestre chamado Bellon, morto em 1740 com a idade de 79 anos, quem se lhe apresentou a pedir conselhos para escapar à perseguição de dois órfãos. Ela lhe deu os conselhos solicitados e, ao cabo de seis meses, a alma não mais voltou. 

Essa morte está mencionada nos registos da paróquia de Lenach, com uma nota assinalando que o burgomestre causara dano a muitas crianças das quais era tutor.” 

Acrescenta o Doutor Kerner que poderia citar uma vintena de aparições, cuja autenticidade foi depois verificada. Estando perfeitamente reconhecida a honradez desse doutor e achando-se quase sempre de cama a Sra. Hauffe, sem poder locomover-se e cercada de membros de sua família, nenhum embuste fora possível. São, pois, reais os factos e, se bem hajam ocorrido muito antes que se falasse de Espiritismo, guardam as maiores analogias com os que presentemente se observam.


GABRIEL DELANNE, A Alma é Imortal, Primeira parte – A observação, Capítulo II ESTUDO DA ALMA PELO MAGNETISMO, fragmento.
(imagem: Marquês de Puységur 1751-1825)

2 comentários:

Carlos Pires disse...

Parabens Amigo Gilberto, pelos teus artigos.
Um abraço

Gilberto Ferreira disse...

Muito obrigado amigo Carlos, é para mim um grande privilégio contar com um camarada de armas, desde batalhas do passado, nas fileiras da “guerra” pela terna e grandiosa beleza, que tem, a consoladora VERDADE da vida…

Gilberto Ferreira