V
A Justiça Divina e a
Actual Guerra
|14 de julho de 1915|
Deus podia, do ponto de vista material, evitar a guerra,
entretanto, do ponto de vista moral não podia fazê-lo, visto que uma de suas
supremas leis exige que todos nós, individual ou colectivamente, soframos as
consequências de nossos actos.
Todas as nações empenhadas na presente guerra são culpadas,
em diversos graus. A Alemanha levantou contra si as forças vingadoras, pelo seu
orgulho insensato, o culto da força bruta, o desprezo ao direito, suas mentiras
e seus crimes.
O orgulho excessivo acarreta sempre a queda e o fracasso:
foi a sorte de Napoleão e será a de Guilherme II. As responsabilidades deste
último são tremendas, porque sua atitude não produz apenas hecatombes sem
precedentes na História; ela poderia também retirar da Europa a coroa da
civilização. Ele conseguiu iludir a opinião pública durante muito tempo, mas
não enganará a justiça eterna.
Já dissemos que, relativamente à França, a leviandade, a
imprudência, o amor descontrolado dos prazeres deveriam atrair-lhe
inevitavelmente duras provas. Assinalemos que foi um dia após um processo, onde
a podridão nacional se destacava claramente, que a guerra explodiu.
O que existia de pior entre nós não eram os nossos defeitos,
porém um estado de consciência que não distinguia mais o bem do mal: é a pior
das condições morais.
Os laços de família estavam afrouxados de tal modo que um
filho era considerado como uma carga, daí o despovoamento que, como
consequência de nossos vícios, nos tornou fracos e diminuídos diante de um
temível adversário; mas a alma francesa ainda conservava enormes recursos,
podendo sair retemperada desse banho de sangue.
Diante da divina justiça, não são apenas a Alemanha e a
França as nações responsáveis por enormes dívidas, pois entre os males que
destacamos há muitos que se estendem por toda a Europa.
Encontramos por toda parte criaturas semelhantes àquelas que
existem em torno de nós, cujas consciências desapareceram e fizeram do bem-estar
o objecto exclusivo de suas existências, como, aliás, certos políticos e
estadistas que pretenderam dirigir os destinos de nosso país.
Deus permitiu que as calamidades tivessem um carácter geral,
a fim de reagir contra essas doenças da consciência e esse baixo materialismo.
Caso fossem apenas parciais, muitos teriam assistido com indiferença aos
sofrimentos dos outros.
Para tirar as almas da letargia moral e do profundo mergulho
na matéria era preciso que esse raio abalasse a sociedade até em seus alicerces.
Já será suficiente a terrível lição que nos foi reservada?
Se resultar inútil, se as causas morais da decadência e dos fracassos
continuarem em nós, então seus efeitos continuariam se produzindo, reaparecendo
a guerra com seu cortejo de males.
É necessário, pois, que a vida nacional recomece em bases
morais e que, terminando a tormenta, a alma humana aprenda a se desfazer dos
bens materiais, compreendendo seu desvalor. Sem isso foram estéreis todos os
sofrimentos e nossa bela juventude foi ceifada sem benefícios para a França.
/…
LÉON DENIS, O Mundo Invisível e a Guerra, V – A Justiça
Divina e a Actual Guerra, 2 de 4 15º fragmento da obra.
(imagem: Tanque de guerra britânico capturado pelos Alemães,
durante a Primeira Guerra Mundial)
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