Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

segunda-feira, 18 de junho de 2012

a pedra e o joio~



questão 
metodo-
lógica

   Expostos, nos cinco pontos anteriores, os motivos históricos, espirituais e escriturísticos que nos asseguram a legitimidade da obra de Kardec, demonstrada a sua integração na cultura contemporânea, a confirmação científica, filosófica e religiosa dos seus princípios fundamentais na actualidade e as perspectivas que abre para a renovação cultural, parece-nos inegável a importância fundamental do Espiritismo em nossos dias. Bastaria isso para exigir de todos nós o maior respeito por essa obra ainda tão mal conhecida e mal estudada entre nós. Em consequência, tentativas de reformulá-la não encontram justificativa e as pretensões de a superar chegam às raias (nos dois extremos do processo lógico) da ignorância e da irresponsabilidade.

   Mas para que isso fique mais claro é conveniente tratarmos do problema do método em Kardec. A chamada questão metodológica, de importância basilar em todos os campos do pensamento, passa completamente despercebida entre os opositores, os críticos e os pretensos reformadores da obra de Kardec. É isto o suficiente para mostrar a insuficiência, a incapacidade e o empirismo (no mau sentido do termo) de todos os que defendem teorias e obras reformistas no campo do Espiritismo ou pretendem que certos ramos das Ciências actuais tenham superado a posição espírita, ou, ainda, supõem que suas experiências pessoais, no geral corriqueiras e sem obediência às exigências metodológicas, estão em condições de abrir novos caminhos à pesquisa espírita.

   É simplesmente assombrosa a leviandade com que espíritas e não espíritas, entre gente do povo e homens de cultura, formulam críticas a Kardec sem o conhecerem, sem haverem realmente estudado a sua obra e meditado sobre ela. O próprio Kardec já notara, no seu tempo, a estranha leviandade de homens de ciência que se propunham a opinar sobre questões espíritas sem nada saberem do assunto. A situação continua a mesma em nossos dias. E é evidente que essa continuidade não desmerece a doutrina, mas sim os que se mostram incapazes de compreendê-la.

   Em face dessa situação somos obrigados a tratar do assunto de maneira que muitas vezes parecerá primária a pessoas afeitas a estudos superiores. Somos forçados a lembrar conceitos já considerados vulgares nos meios culturais, a aplicar esquemas analíticos rudimentares (como fizemos em O Verbo e a Carne, no exame do roustainguismo) e a descer a explicações banais de problemas que na verdade não podiam nem deviam existir, mormente no meio espírita. Este problema de método é um deles. Do ponto de vista cultural, é simplesmente vergonhoso que o tenhamos de recolocar constantemente ante os olhos de dirigentes de grupos, de centros e de instituições representativas do movimento doutrinário.
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José Herculano Pires – A Pedra e o Joio, Crítica à Teoria Corpuscular do Espírito. A questão metodológica, 1 de 2, 6º fragmento da obra.
(imagem: As Colhedoras de Grãos, pintura a óleo por Jean-François Millet)

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