Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

terça-feira, 7 de junho de 2011

Nosso Deus da Natureza


“Falta grave, o senso comum? É possível que esses espíritos fortes, galgando o céu por uma escada de paradoxos, acreditem estar bem alto... Enganam-se, porém, redondamente, com essa ilusão comparável àquela antiga prova maçónica, que era percorrer o iniciado uma escada de cento e cinquenta degraus descendentes, de sorte que, ao fim do percurso, no momento de atirar-se ao vácuo, apenas tocava o solo. Não, senhores, vossa escalada não é mais terrível do que essa e apenas pode acarretar maus resultados para os homens de vistas curtas, incapazes de perceber o vosso erro e até considerando-vos as fénix da Ciência. Fosse agradável a vossa ilusão, consoladoras as vossas doutrinas; capazes, as vossas idéias, de estimular a emulação da Humanidade pensante para elevar-se a um ideal supremo, e talvez se pudesse perdoar-vos a terapêutica. Mas, com franqueza: – em que vos parece funesta, à inteligência humana, a crença em Deus? Onde e como verificastes que o conhecimento da verdade pode enfermar o cérebro? Despojando a Humanidade do seu tesouro mais precioso, banindo do Universo a vida, rechaçando da Natureza o espírito, não admitindo mais que a matéria cega e forças zanagas, privais a família humana de ter paternidade e o mundo de ter um princípio e uma finalidade. Gênio e virtude, reflexos de um esplendor maior, eclipsam-se convosco e o mundo moral, tanto quanto o físico, não serão mais que um caos imenso, digno da noite primitiva de Epícuro.
Mas, ainda bem que o ateísmo absoluto só pode ser uma loucura nominal e o espírito mais negativista não pode, realmente, atribuir à matéria senão o que pertence ao espírito, criando assim um deus-matéria, à sua imagem e semelhança. Assim, temos visto que, desde o panteísmo místico ao mais rigoroso ateísmo, os erros humanos a respeito da personalidade divina não puderam, senão, velar, ou desnaturar a revelação do Universo, sem aniquilá-la. Nosso Deus da Natureza permanece inatacável, no seio mesmo da Natureza, força intrínseca e universal governando cada átomo, formando organismos e mundos, princípio e fim das criações que passam, luz incriada a brilhar no mundo invisível e para a qual, oscilantes, se dirigem as almas, como a agulha imantada, que não mais repousa enquanto não se encontra identificada com o plano do pólo magnético.”

FLAMMARION, CAMILLE in “Deus na Natureza” Tomo V – DEUS, (7 de 7)
(imagem: Salvador Dali, 1942_33)

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