Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

~explicações em proporção com os conhecimentos ao tempo~


   A história da origem de quase todos os povos antigos confunde-se com a da sua religião:
é por isso que os seus

primeiros livros foram livros religiosos;
e, como todas as religiões que se ligam ao princípio das coisas, que é também o da humanidade, deram sobre a formação e organização do Universo explicações em proporção com o estado dos conhecimentos do tempo e dos seus fundadores.
Daí resultou que os primeiros livros sagrados fossem ao mesmo tempo os primeiros livros de ciência, assim como foram durante muito tempo o único código das leis civis.

   Nos tempos primitivos, sendo os meios de observação necessariamente muito imperfeitos, as primeiras teorias sobre o sistema do mundo deviam estar manchadas de erros grosseiros;
mas se esses meios tivessem sido completos tal como o são hoje, os homens não teriam sabido servir-se deles;
não podiam ser aliás mais do que o produto do desenvolvimento da inteligência e do conhecimento sucessivo das leis da natureza.
À medida que o homem foi evoluindo no conhecimento dessas leis, penetrou nos mistérios da Criação e corrigiu as ideias que fazia sobre as coisas.

   O homem foi impotente para resolver o problema da Criação até ao momento em que a chave lhe foi dada pela ciência.
Foi preciso que a astronomia lhe abrisse as portas do espaço infinito e lhe permitisse mergulhar nele o seu olhar;
que pela força do cálculo, pudesse determinar com rigorosa precisão o movimento, a posição, o volume, a natureza e o papel dos corpos celestes;
que a física lhe revelasse as leis da gravidade, do calor, da luz e da electricidade;
que a química lhe ensinasse as transformações da matéria e a mineralogia os materiais que formam a crosta do globo;
que a geologia lhe ensinasse a ler nas camadas terrestres a formação gradual desse mesmo globo.
A botânica, a zoologia, a paleontologia, a antropologia, iriam iniciá-lo na filiação e na sucessão dos seres organizados;
com a arqueologia, foi-lhe possível seguir os traços da humanidade através dos tempos;
todas as ciências, numa palavra, completando-se umas às outras, iriam dar o seu contributo indispensável ao conhecimento da História do mundo;
na sua falta, o homem só tinha por guia as suas primeiras hipóteses.

   Também, antes de o homem estar na posse destes elementos de apreciação, todos os comentadores da Génese, cuja razão embatia em impossibilidades materiais, giravam num mesmo círculo sem dele poderem sair;
só o puderam fazer quando a ciência abriu o caminho, cavando uma brecha no edifício das crenças, e então tudo mudou de aspecto;
uma vez encontrado o fio condutor, as dificuldades foram completamente reduzidas;
em vez de uma Génese imaginária, obtivemos uma Génese positiva e, de certo modo, experimental;
o campo do Universo estendeu-se ao infinito;
viu-se a Terra e os astros a formarem-se gradualmente segundo as leis eternas e imutáveis que testemunham bem melhor a grandeza e a sabedoria de Deus que uma criação miraculosa saída subitamente do nada, como uma alteração à vista graças a uma ideia súbita da Divindade após uma eternidade de inacção.

   Uma vez que é impossível conceber a Génese sem os dados fornecidos pela ciência, podemos dizer na verdade que:
a ciência é chamada a formar a verdadeira Génese segundo as leis da natureza.


ALLAN KARDEC, A GÉNESE – Os Milagres e as Profecias Segundo o Espiritismo – Capítulo IV, PAPEL DA CIÊNCIA NA GÉNESE 1, 2 e 3, tradução portuguesa de Maria Manuel Tinoco, Editores Livros de Vida
(imagem: A Criação de Adão, detalhe do tecto da Capela Sistina, por Michelangelo)

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