Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Deus na Natureza~


Introdução

   Nesta nossa época de observação e experimen-tação, os materialistas procuram apoiar-se em trabalhos científicos e pretendem deduzir da ciência positiva o seu sistema.

   Os espiritualistas, em geral, acreditam, ao invés, poderem pairar acima da esfera experimental e chegar  aos píncaros da razão pura. Ao nosso ver, o espiritualismo para triunfar deve medir-se com o adversário no mesmo terreno e com as mesmas armas. Ele não perderá nada do seu caráter, condescendendo em baixar à arena, e nada terá a recear nesse confronto com a ciência experimental.

   As lutas empenhadas e os erros a combater estão longe de se tornarem perigosos para a causa da verdade. Com o exigirem um exame mais rigoroso das questões versadas, essas lutas nos ensejam a preparação de uma vitória mais completa.

   A Ciência não é materialista, nem pode servir ao erro. Como e por que, pois, haveriam de temê-la o espiritualismo e a verdadeira religião? Duas verdades não se podem opor a uma terceira.

   Se Deus existe, sua existência não poderia ser suspeitada nem combatida pela Ciência.

   Para nós, temos a convicção íntima de que, muito pelo contrário, no estabelecimento de conhecimentos exatos sobre a construção do Universo, sobre a vida e o pensamento, propicia-se atualmente o único método eficiente ao aclaramento do problema. Só assim poderemos saber se devemos admitir a soberania da matéria universal ou se importa reconhecer uma inteligência organizadora, um plano e um destino imanentes.

   Tal, pelo menos, a forma por que o debate se nos apresenta e impõe à mente, neste nosso trabalho.

   Esperamos que esta tentativa de versar a existência de Deus pelo método experimental aproveite ao progresso de nossa época, por estar de acordo com as suas tendências características.

   Ficaremos satisfeitos se a leitura deste livro deixar cair uma fagulha luminosa nos espíritos indecisos. Mais ainda, se depois de haver meditado fundo estes nossos estudos, alguma fronte se levantar consciente de sua legítima dignidade.

   Se, regra geral, os ideólogos franceses não têm aplicado o método científico aos problemas da filosofia natural, em compensação alguns sábios trataram o assunto do ponto de vista das relações gerais manifestadas no mundo e que lhe constituem a unidade viva. Com prazer assinalamos, entre as obras deste género, os diversos trabalhos do Sr. A. Langel, aqui mesmo utilizados várias vezes.

   Problemas da Natureza e problemas da vida não conduzem eles, efetivamente, ao máximo problema? Examinar as forças ativas no organismo universal não será o mesmo que examinar as diversas modalidades da força essencial e original?

   As investigações que focalizam o estudo da Natureza podem aproveitar à Filosofia com maior segurança, às vezes, do que os tratados ou os ditirambos especialmente consagrados à Metafísica. Os próprios escritos dos senhores Moleschott e Buchner nos ofereceram elementos de refutação.

   A circulação da vida, qual a expõe o primeiro, mostra na vida uma força independente e transmissível, dirigindo os átomos, mediante leis determinadas e conforme o tipo das espécies. O exame da Força e da Matéria estabelece, por outro lado, a soberania da Força e a inércia da Matéria.

   Sendo a Força e a extensão os primeiros princípios do conhecimento, e sendo a Filosofia a ciência dos princípios, poderia esta obra ser considerada antes como um estudo filosófico, se não houvéssemos resolvido limitar-nos a uma discussão puramente científica. Este, efetivamente, o seu fim precípuo e que, por bem dizer, oferece mais atrativos, mau grado à aridez aparente do trabalho.

   Pensamos que o único meio eficaz de combater o negativismo contemporâneo é voltar contra ele o materialismo científico e utilizar as suas próprias armas para derrotá-lo.

   Esse discrime compete antes à Ciência que à Filosofia.

   A Ideologia, a Metafísica, a Teologia, mesmo a Psicologia, dele se afastaram quanto possível.

   Nós não razoamos com palavras, mas com factos.
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Camille Flammarion, Deus na Natureza – Introdução 3 de 4, 3º fragmento.
(imagem: Jungle Tales_1895, pintura de James Jebusa Shannon)

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