(Em casa do Sr. Baudin; médium: Srta. Baudin / 17 de
janeiro de 1857)
O Espírito prometera escrever-me uma carta por ocasião da
entrada do ano. Tinha, dizia, qualquer coisa de particular a me dizer.
Havendo-lhe eu pedido numa das reuniões ordinárias, respondeu que a daria na
intimidade ao médium, para que este ma transmitisse. É esta a carta:
“Caro amigo, não te quis escrever terça-feira última diante
de toda a gente, porque há certas coisas que só particularmente se podem dizer.
“Eu queria, primeiramente, falar-te da tua obra, a que
mandaste imprimir. (O Livro dos Espíritos entrará para o prelo.)
Não te afadigues tanto, de manhã à noite; passarás melhor e a obra nada perderá
por esperar.
“Segundo o que vejo, és muito capaz de levar a bom termo a tua
empresa e tens que fazer grandes coisas. Nada, porém, de exagero em coisa
alguma. Observa e aprecia tudo judiciosa e friamente. Não te deixes arrastar
pelos entusiastas, nem pelos muito apressados. Mede todos os teus passos, a fim
de chegares ao fim com segurança. Não creias em mais do que aquilo que vejas; não
desvies a atenção de tudo o que te pareça incompreensível; virás a saber a
respeito mais do que qualquer outro, porque os assuntos de estudo serão postos
sob as tuas vistas.
“Mas, ah! a verdade não será conhecida de todos, nem crida,
senão daqui a muito tempo! Nessa existência não verás mais do que a aurora do
êxito da tua obra. Terás que voltar, reencarnado noutro corpo, para
completar o que houveres começado e, então, dada te será a satisfação de ver em
plena frutificação a semente que houveres espalhado pela Terra.
“Surgirão invejosos e ciosos que procurarão infamar-te e
fazer-te oposição: não desanimes; não te preocupes com o que digam ou façam
contra ti; prossegue na tua obra; trabalha sempre pelo progresso da Humanidade,
que serás amparado pelos bons Espíritos, enquanto perseverares no bom caminho.
‘Lembras-te de que, há um ano, prometi a minha amizade aos
que, durante o ano, tivessem tido um proceder sempre correcto? Pois bem!
declaro que és um dos que escolhi entre todos.”
Teu amigo que te quer e protege. — Z.
NOTA — Já tive ocasião de dizer que Z. não era
um Espírito superior, porém muito bom e muito benfazejo. Talvez fosse mais
adiantado do que o deixava supor o nome que tomara. Legitimavam esta suposição
o carácter sério e a sabedoria de suas comunicações, conforme as
circunstâncias. Sob a capa daquele nome, ele se permitia usar de uma linguagem
familiar apropriada ao meio onde se manifestava e dizer, como frequentemente
sucedia, duras verdades, sob a forma leve do epigrama. Como quer que seja, dele
guardei sempre grata recordação e muito reconhecimento pelas boas advertências
que sempre me deu e pelo devotamento que me testemunhou. Desapareceu com a
dispersão da família Baudin, dizendo que em breve reencarnaria.
/…
ALLAN KARDEC, Obras Póstumas, A minha Primeira
Iniciação no Espiritismo, Primeira Notícia de Uma Nova Encarnação,
4º fragmento da obra.
(imagem de ilustração: Dança rebelde, 1965 – Óleo sobre tela, de Noêmia Guerra)
(imagem de ilustração: Dança rebelde, 1965 – Óleo sobre tela, de Noêmia Guerra)
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