O desprezo pela dialética
Dizia Engels, no artigo: “...não se pode desprezar
impunemente a dialética.” E dizia bem. Senão, vejamos: observados os factos com
o máximo rigor científico, através de centenas de sessões – nas quais se obteve,
inclusive, na presença de Gabriel Delanne, a célebre e impressionante
materialização de Bien-Boa, na casa do general Noel, na Argélia –, Charles
Richet se convence da realidade dos fenómenos, escreve o Traité de Métapsychique, A
Grande Esperança e O Sexto Sentido,
mas só concorda com a sobrevivência depois que a poderosa dialética de Ernesto
Bozzano lhe demonstra a obscuridade das teorias que atravancam a sua própria
ciência (expressões da carta de Richet a Bozzano, publicada no número de 30 de
maio de 1936, da revista londrina Psychic
News).
César Lombroso, o grande criminologista e psiquiatra, autor
de severas críticas ao Espiritismo, encontra-se, não apenas em uma, mas em
várias sessões realizadas em Milão, Génova e Turim, com a materialização de sua
própria mãe, graças à mediunidade de Eusápia Palladino, e proclama o facto com
entusiasmo e emoção, na revista milanesa Luce
e Ombra. Mas o professor Silva Mello descobre, algumas dezenas de anos mais
tarde, em nosso país, que a médium era simplesmente “uma embusteira”, e afirma:
“descobriu-se que ela fraudava de maneira sistemática e com a maestria de uma
velha perita na questão”. Lombroso, como se vê, não fora mais do que um beócio,
deixando-se empolgar pela emoção mais estúpida que se possa imaginar, quando
tomou um boneco ou um farsante pela ressurreição da sua própria mãe! Que se
admitisse a farsa numa comédia de Hollywood, vá lá, mas na vida de um homem
como Lombroso é o que de mais grotesco se possa imaginar.
A frase de Engels se aplica também, como luva, ao caso do
trio H. G. Wells, Julian Huxley e G. P. Wells. Não cometeram eles, é verdade, a
gafe de negar a realidade dos fenómenos. Pelo contrário, como o Dr. Troise,
reconheceram, prudentemente, que os factos existem e não podem ser riscados da
história ou apagados com a esponja da negação. No volume Science of Life, da coleção Man's
mind and behaviour, traduzidos e publicados entre nós com os títulos A Nossa Vida Mental, coleção A Ciência da Vida, reconhecem eles: “Não
podemos absolutamente rejeitar a evidência de tais fenómenos”. E acrescentam,
aliás com muita oportunidade, censurando os que os negam:
“Lembremo-nos, segundo Richet, de que grandes cientistas,
como Bouillaud, declararam que o telefone era ventriloquia, e cientistas ainda
maiores, como Lavoisier, afirmaram decisivamente que não poderiam cair pedras
do céu, pela razão muito simples de que no céu não há pedras...”
Não obstante – ah, o desprezo pela dialética! –, terminaram
apelando, num desesperado esforço de rejeição à tese espírita, ao “realismo” da
Idade Média, para explicar os factos: “Quando filosofamos – dizem eles – nas
horas de recolhimento e de silêncio, talvez essa filosofia não parta unicamente
de nós, mas seja o próprio Homem, na plenitude de si mesmo, que se revele
através dos nossos pensamentos”.
Entenderam os leitores? Esse Homem (com “H” maiúsculo) é a
verdadeira ressurreição da múmia filosófica da controvérsia entre
“nominalistas” e “realistas”, arrancada à força dos baús medievais para
enfrentar a realidade fenoménica do Espiritismo, em plena era atómica.
/…
José Herculano Pires, Espiritismo Dialético – O desprezo pela dialética, 6º fragmento da obra.
(imagem: Diógenes, pormenor d'A escola de Atenas de Rafael Sanzio, 1509)
(imagem: Diógenes, pormenor d'A escola de Atenas de Rafael Sanzio, 1509)
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