~ Uranografia Geral (*)
O espaço e o tempo ~
| Galileu, Espírito
(Études Uranographi-ques) (I)
| Galileu, Espírito
(Études Uranographi-ques) (I)
~ O espaço e o tempo 🌈
Têm-se dado várias definições de espaço; a principal é esta: o espaço é a extensão que separa dois corpos. De onde certos sofistas deduziram que onde não houver corpos, não haverá espaço; foi no que se basearam os doutores em teologia para estabelecer que o espaço era necessariamente finito, alegando que corpos limitados num certo número não poderiam formar uma sucessão infinita; e que onde os corpos parassem, o espaço também pararia. Definiu-se também o espaço: o lugar onde os mundos se movem, o vazio onde a matéria age, etc. Deixemos nos tratados onde repousam todas estas definições que não definem nada.
O espaço é uma dessas palavras que representam uma
ideia primitiva e axiomática, evidente por si mesma, e as diversas definições
que lhe podemos dar só servem para a obscurecer. Sabemos todos o que é o espaço
e eu só quero estabelecer a sua infinidade para que
os nossos ulteriores não tenham qualquer barreira a opor-se às investigações da
nossa maneira de ver.
Ora, digo que o espaço é infinito
por ser impossível imaginar-lhe um limite e que apesar da dificuldade que temos
em conceber o infinito, é-nos no entanto mais fácil viajar eternamente no
espaço, em pensamento, que pararmos num sítio qualquer para além do qual não
encontrássemos mais extensão a percorrer.
Para imaginarmos, tanto quanto o permitem as nossas
faculdades da Terra, perdida no meio do infinito, em direcção a um ponto
qualquer do Universo e isto com a velocidade prodigiosa da faísca eléctrica que
percorre milhares de milhas em cada segundo, mal tivéssemos saído
deste globo, tendo percorrido milhões de léguas, encontrávamo-nos num sítio de
onde a Terra já só nos aparecia com o aspecto de uma pálida estrela. Um
instante depois, seguindo sempre a mesma direcção, chegávamos às estrelas
longínquas que mal se avistam da nossa estação terrestre; e daí,
não só a Terra estaria completamente perdida para o nosso olhar nas profundezas
do céu como também o vosso próprio Sol no seu esplendor estaria eclipsado pela
extensão que nos separa dele. Animados sempre com a mesma rapidez do relâmpago,
atravessávamos estes sistemas de mundos à medida que íamos
avançando na vastidão, ilhas de luz etérea, vias estelares, paragens sumptuosas
onde Deus semeou mundos
com a mesma profusão com que semeou as plantas nas pradarias terrestres.
Ora, há só alguns minutos que caminhamos e já
centenas de milhões e milhões de léguas nos separam da Terra, milhares de
mundos nos passaram debaixo dos olhos e, no entanto escutai! Na realidade, não
avançamos um único passo no Universo
Se continuarmos durante anos, séculos, milhares de
séculos, milhões de períodos cem vezes seculares e incessantemente com
a mesma velocidade do relâmpago, não teremos avançado mais! E isto seja
qual for o lado para que vamos e em direcção seja a que ponto for a partir
deste grão invisível que deixámos e que se chama Terra.
É isto o espaço!
O tempo,
tal como o espaço, é uma palavra definida por si mesma; fazemos dele uma ideia
mais correcta estabelecendo a sua relação com o todo infinito.
O tempo é a sucessão das coisas; está
ligado à eternidade da mesma maneira que estas coisas estão ligadas ao infinito:
imaginemo-nos na origem do nosso mundo, nessa época primitiva quando a Terra
não balouçava ainda sob o impulso divino; numa palavra, no início da Génesis.
Aí, o tempo não saiu ainda do misterioso berço da natureza; e nada pode
dizer em que era de séculos nós estamos, dado que o pêndulo
dos séculos não está ainda em movimento.
Mas silêncio! A primeira hora de uma Terra isolada
soa na sineta eterna, o planeta situa-se no espaço e imediatamente passa a
haver noite e manhã. Para lá da Terra, a
eternidade permanece impassível e imóvel apesar de o tempo avançar para
muitos outros mundos.
Na Terra, o tempo substitui-a e
durante uma série determinada de gerações, contar-se-ão os anos e os séculos.
Transportemo-nos agora até ao último dia deste mundo,
à hora em que, curvada ao peso da vetustez, a Terra se
apagará do livro da vida para não voltar a aparecer: aqui a sucessão de
acontecimentos pára; os movimentos terrestres que mediam o
tempo interrompem-se e o tempo acaba com eles.
Esta exposição simples das coisas naturais que dão
origem ao tempo, o alimentam e deixam que se acabe, basta para mostrar que,
vista do ponto onde nos devemos situar para os nossos estudos, o tempo é
uma gota de água que cai da nuvem para o mar e cuja queda
é calculada.
Quantos os mundos na vasta extensão, outros tantos tempos diversos e incompatíveis. Fora dos mundos, só a eternidade substitui estas sucessões efémeras e preenche pacificamente com a sua luz imóvel a imensidão dos céus. Imensidão sem limites e eternidade sem limites são estas as duas grandes propriedades da natureza universal.
O olho do observador que atravessa, sem nunca
encontrar paragem, as incomensuráveis distâncias do espaço e o do geólogo que
recua para além do limite das eras ou que desce às profundezas da eternidade hiante, onde um dia se perderão,
agem de acordo, cada qual na sua via, para adquirir essa dupla noção de
infinito: extensão e duração.
Ora, mantendo essa ordem de ideias, ser-nos-á fácil
conceber que não sendo o tempo mais
do que a relação das coisas transitórias e
dependendo unicamente das coisas que se medem, se,
tomando os séculos terrestres por unidades, os acumularmos milhares sobre
milhares para com eles formar um número colossal, este número nunca
representaria mais que um ponto na eternidade; tal como os
milhares de léguas juntos aos milhares de léguas não passam de um ponto na
vastidão.
Assim, por exemplo, estando os séculos fora da vida etérea da
alma, poderíamos escrever um número tão comprido como o equador terrestre e
supormo-nos mais velhos esse número de séculos, sem que na realidade a nossa
alma conte um dia a mais; e acrescentando a esse número infindável
de séculos uma série extensa como daqui ao Sol de números semelhantes, mais
consideráveis ainda, e imaginando-nos a viver durante a prodigiosa sucessão
de períodos seculares representados pela adição de tais números,
quando chegássemos ao fim, o amontoado incompreensível de séculos a pesarem-nos
sobre as nossas cabeças seria como se não existissem: à nossa
frente permaneceria sempre a eternidade inteira.
O tempo não passa de uma medida relativa da
sucessão das coisas; a eternidade não é susceptível de qualquer medida do
ponto de vista da duração; para ela, não há começo nem fim:
para ela tudo é presente.
Se séculos de séculos são menos que um segundo em
relação à eternidade, o que será a duração da vida humana?
Espírito Galileu
Espírito Galileu
A matéria
À primeira abordagem, nada parece tão profundamente
variado, tão essencialmente distinto como várias substâncias que compõem o
mundo. Entre os objectos que a arte ou a natureza nos fazem todos os dias
passar debaixo dos olhos, existem dois que revelam uma identidade perfeita ou
somente uma paridade de composição? Que diferença do ponto de vista da solidez,
da compressibilidade, do peso e das propriedades múltiplas dos
corpos, entre os gases atmosféricos e o fio de ouro; entre a molécula aquosa
da nuvem e a do mineral que forma o esqueleto ósseo do globo! Que diversidade
entre o tecido químico das plantas variadas que decoram o reino vegetal e o dos
representantes não menos numerosos da animalidade sobre a Terra!
No entanto, podemos colocar como princípio absoluto
que todas as substâncias conhecidas e desconhecidas, por muito diferentes que
pareçam quer do ponto de vista da sua constituição intima, quer da relação da
sua acção recíproca, não são, de facto, mais do que modos diversos sob
os quais a matéria se apresenta; em quantas variedades se transformou sob
a orientação das inúmeras forças que a governam.
A química, cujos progressos foram tão
rápidos desde a minha época, quando os seus próprios adeptos a
relegaram ainda para o domínio secreto da magia, esta nova ciência que
podemos com razão considerar filha do século observador e como unicamente
baseada, muito mais solidamente que as suas irmãs mais velhas, no método
experimental; a química, digo eu, usou bem os quatro elementos primitivos que
os Antigos tinham consentido em reconhecer na natureza; mostrou que o
elemento terrestre não é mais do que a combinação de
substâncias diversas variadas ao infinito; que o ar e a água são igualmente decomponíveis e
produto de um certo número de equivalentes do gás; que o fogo, longe de ser, também ele,
um elemento principal, não passa de um estado da matéria
resultante do movimento universal a que está submetida e de uma combustão
sensível ou latente.
Em contrapartida, encontrou um número considerável de
princípios até então desconhecidos que lhe pareceram formar, pelas suas
combinações determinadas, os diversos corpos que estudou e que agem
simultaneamente consoante certas leis e em certas proporções, nos trabalhos
executados no grande laboratório da natureza, a estes princípios deu o nome
de corpos simples, indicando com isso que os considerava primitivos e
não decomponíveis e que nenhuma operação, até hoje, os pode reduzir a partes
relativamente mais simples que eles mesmos (ii).
Mas onde as apreciações do homem param, até ajudados
pelos seus sentidos artificiais mais impressionáveis, a obra da natureza
continua; onde a pessoa vulgar toma a aparência pela realidade, onde o prático
levanta o véu e distingue o início das coisas, o olho do que conseguiu
captar o modo de acção da natureza só vê nos materiais que constituem o mundo
a matéria cósmica primitiva, simples e una, diversificada
em certas regiões na época do seu nascimento, dividida em corpos solidários
durante a sua vida, materiais desmembrados um dia no receptáculo da vastidão
pela sua decomposição.
Há questões assim que nós mesmos, espíritos
apaixonados pela ciência, gostaríamos de aprofundar e sobre as quais só
poderíamos emitir opiniões pessoais mais ou menos conjecturadas; sobre estas
questões calar-me-ei ou justificarei a minha maneira de ver; mas esta não faz
parte desse número. Aos que então se sentissem tentados a ver nas
minhas palavras unicamente uma teoria fortuita, direi: Abarcai, se
possível, num olhar investigador, a multiplicidade de operações da natureza e
reconhecereis que, se não admitirmos a unidade da matéria, é
impossível explicar não direi unicamente os sóis e as esferas, mas, sem ir
tão longe, a germinação de uma semente na Terra ou a produção de um insecto.
Se observamos uma tal diversidade na matéria é
porque as forças que presidiram às suas transformações, as
condições em que se produziram, sendo em número ilimitado, as combinações
variadas da matéria só podiam ser elas mesmas ilimitadas.
Portanto, quer a substância que encaramos pertença aos fluidos propriamente
ditos, quer dizer aos corpos imponderáveis, ou quer esteja revestida com
os caracteres e as propriedades ordinárias da matéria, só há em todo o Universo
uma única substância primitiva: o cosmo ou matéria
cósmica dos uranógrafos.
Espírito Galileu
/…
(*) Este capítulo foi textualmente extraído de uma série de
comunicações ditadas à Sociedade Espírita de Paris, em 1862 e 1863, sob o
título de Études Uranographiques e assinado Galileu; médium M. C.
F. (N. do A.)
(ii) Os principais corpos simples são: entre os corpos não metálicos o oxigénio, o hidrogénio, o azoto, o cloro, o carbono, o fósforo, o enxofre, o iodo; entre os corpos metálicos: o ouro, a prata, a platina, o mercúrio, o chumbo, o estanho, o zinco, o ferro, o cobre, o arsénio, o sódio, o potássio, o cálcio, o alumínio, etc. (N. do A.)
(ii) Os principais corpos simples são: entre os corpos não metálicos o oxigénio, o hidrogénio, o azoto, o cloro, o carbono, o fósforo, o enxofre, o iodo; entre os corpos metálicos: o ouro, a prata, a platina, o mercúrio, o chumbo, o estanho, o zinco, o ferro, o cobre, o arsénio, o sódio, o potássio, o cálcio, o alumínio, etc. (N. do A.)
ALLAN KARDEC, A GÉNESE – Os Milagres e as
Profecias Segundo o Espiritismo, Capítulo VI, Uranografia Geral, O espaço e o
tempo, A matéria (de 1
a 7), 23º fragmento desta obra. Tradução portuguesa de
Maria Manuel Tinoco, Editores Livros de Vida.
(imagem de contextualização: Diógenes e
os pássaros de pedra, pintura em acrílico de Costa Brites).
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