VIII – Espiritismo e Psicologia |
Estamos na Era Psicológica, sob o signo avançado da Psi, a letra grega que designa os fenómenos parapsicológicos. Até 1930 os críticos do Espiritismo tentavam explicar os processos mediúnicos por hipóteses psicológicas. Depois dessa data, com as pesquisas de Rhine e da sua
equipa, o socorro inesperado da Parapsicologia forneceu novas armas aos
negadores. Tivemos o espectáculo de uma estranha euforia nos meios
intelectuais: os homens de cultura proclamavam com entusiasmo a absoluta
nulidade destes fenómenos. Não eram mais do que pó que se reverte ao pó. Isso
era suficiente para mostrar que a consciência mundial estava muito pesada. Mas
dez anos depois das difíceis investigações iniciais da Universidade de Duke, as
pesquisas tomaram um ritmo acelerado e Rhine anunciou as suas absurdas descobertas: o pensamento não é físico; há no
homem um conteúdo extrafísico; a mente sobrevive à morte do corpo; a percepção extra-sensorial supera todas as barreiras físicas. Vassiliev,
na URSS, dispôs-se a desfazer essas balelas burguesas e fracassou no seu
intento. Soal e Carington,
da Universidade de Londres e Cambridge, afirmaram a sobrevivência da alma e
tiveram o desplante de obter sucesso com as experiências de voz-directa (psicofonia), fenómeno em que
uma entidade espiritual falava directamente, fazendo vibrar a sua voz no ar.
Price, também da Universidade de Londres, teve a audácia de explicar as
assombrações londrinas como manifestações de espíritos.
A última esperança das libélulas humanas, dos homens-pó,
apagava-se como chama de fogo-de-artifício nas
mãos dos negadores. Surgiram então os mágicos de palco e os
politiqueiros de feira, sacerdotes broncos e frades ignorantes, para combater com
os seus truques ingénuos aquilo mesmo que eles pregavam e que era a base
do seu profissionalismo religioso: a sobrevivência da
criatura humana. Esse atrevimento causou mal-estar no próprio clero,
que via o seu prestígio cultural abalado perante as elites
culturais. O que esses mágicos de palco semearam no mundo, através da televisão,
jornais, revistas, livros, conferências e cursos pseudocientíficos, tudo
isso muito rendoso financeiramente, constitui o lixo subcultural do Século XX e
explica a razão das contradições espantosas da nossa
época. A miséria mental desses mágicos de picadeiro encontrava
ressonância nas camadas ignorantes do povo e, uma refracção espantosa,
projectava a imagem da miséria cultural
de figuras emplacadas nos
meios universitários e eclesiásticos para o trânsito nas vias obscuras do
submundo cultural. Tudo servia, como sempre, no vale-tudo da luta
contra o Espiritismo.
Surgiu um clarão nas trevas: a descoberta do corpo bioplásmico do
homem e a prova científica da sua sobrevivência, obtida pelos cientistas
soviéticos em pesquisas biofísicas na Universidade de Kirov. Na
fortaleza ideológica do Materialismo Científico
no mundo havia sido descoberta a realidade do corpo espiritual da
tradição cristã, o perispírito da
terminologia espírita, que o Apóstolo Paulo chamara
com ênfase de corpo da ressurreição. A única medida possível contra
isso foi logo tomada pelo oficialismo soviético, negando validade à descoberta
oficialmente realizada e sustando a divulgação de novas informações a respeito.
Esse contragolpe só teve, naturalmente, efeito político. Não se podia
impedir o avanço irrefreável das Ciências, mas a censura soviética foi bem
recebida pelos homens-pó da vacilante cultura ocidental e fez-se o
silêncio desejado sobre a mais importante conquista científica do século. Os
mágicos de picadeiro, jejunos em
ciências, desertores da razão, intoxicados de incoerência, cantaram de galo nas
brigas da ignorância.
Apesar dessa nova euforia dos adeptos do nada, esse conceito vazio, segundo Kant, as pesquisas
parapsicológicas se intensificaram na URSS e em toda a órbita soviética. Na
Roménia, para evitar complicações políticas aos investigadores do paranormal,
forjou-se um novo nome para a Ciência de Rhine, que passou a
chamar-se Psicotrónica. O nome rebarbativo funciona
como cobertura táctica para os pesquisadores. Sentados comodamente no
trono do psiquismo, os
psicotrónicos disfarçam o seu interesse de sobreviver após a morte,
imitando a táctica do Prof. Raikov na Universidade de Moscovo, para pesquisar a reencarnação como
simples fenómeno psicológico. Bastam essas manobras anticientíficas
para provar quanto estava certo Léon Denis, numa
conferência em Paris, na década de 1920, sobre o tema A Missão do Século
XX. O Druida da Lorena, como Conan Doyle o
chamava, previu que o nosso século seria o da vitória do Espiritismo, com a
comprovação científica dos seus princípios. Aí estão as provas obtidas
através de pesquisas científico-tecnológicas, ao gosto do nosso tempo. Filosófica,
científica e religiosamente o Espiritismo encontrou,
no nosso século, as comprovações de sua veracidade, não produzidas
pelos adeptos, mas pelos seus mais poderosos adversários.
No campo psicológico, o desenvolvimento da Psicanálise, a
partir de Freud,
atingiu com Jung o
momento crítico da revelação dos arquétipos, só possíveis nas dimensões do
espírito, e por fim, a teoria das coincidências significativas (contribuição junguiana à
Parapsicologia) as confissões mediúnicas do grande
psicólogo nas suas memórias e a sua confiança na descoberta científica da alma. Em
1944 Jung encerrou o seu livro a respeito declarando: “Estou convencido do
estudo científico da alma como ciência do futuro. A Parapsicologia é a mais
jovem das Ciências Humanas e o seu desenvolvimento não foi ainda além dos
primeiros passos.”
A Gestalt ou
Psicologia da Forma, no campo da Psicologia da Percepção, revelou o princípio
de unidade formal em que se destaca o fenómeno da pregnância, e
mostrou que não vivemos segundo a realidade concreta do mundo, mas
segundo a nossa ilusão psicológica, dessa realidade, confirmando o princípio espírita das
aparências significativas. Da conjugação dialéctica dessas duas
correntes fundamentais da Psicologia contemporânea surgiu a síntese da
concepção parapsicológica do homem, com o domínio do inconsciente na
interpretação das percepções sensoriais, abrindo-se para as dimensões da
percepção extra-sensorial. A descoberta científica do perispírito confirmou
essa tese no plano objectivo, revelando de novo (em termos espíritas) a fonte secreta
das captações e manifestações paranormais. O plasma físico do perispírito (corpo
semimaterial, segundo Kardec) é
dirigido nas manifestações pelos elementos não-físicos do corpo
espiritual.
Os teóricos desavisados do inconsciente, como os da
escrita automática e dos fenómenos físicos da mediunidade, esquecem-se
(ou nunca tomaram conhecimento) dos estudos e das pesquisas de Kardec, Aksakof e Bozzano sobre o
animismo ou manifestações da própria alma ou
espírito do médium nas
manifestações mediúnicas. Formulam,
assim, hipóteses superadas logo no início das pesquisas espíritas, quando o próprio Freud ainda não
tinha nascido.
Kardec foi
também o primeiro a notar as interferências anímicas
nas manifestações, por influência sugestiva e natural das lembranças antigas ou
recentes do médium.
Essas infiltrações (que acontecem também em plena vigília de todos nós),
decorrem da lei de associação de
ideias, mas são facilmente identificáveis pelos
pesquisadores e as pessoas experimentadas na prática mediúnica. Ochorowicz, por
exemplo, chegou ao cúmulo, nas suas experiências de materialização com
a médium Stanislawa,
de considerar a entidade que se materializava como desdobramento material
da médium. Chamava o espírito materializado de Stanislawa II. Levou, assim, a
manifestação do animismo ao extremo de uma suposta divisão do organismo da
médium em dois corpos diferentes. Não obstante, Stanislawa II era bem
diferenciada da médium, tanto física como psicologicamente. Muitos absurdos
dessa espécie foram cometidos na pesquisa espírita por cientistas rigorosos que
se viam aturdidos com o acontecimento dos factos. Os psicólogos
actuais, que pretendam opinar sobre questões espíritas, deviam ter a
honestidade de primeiro estudar a Doutrina e a sua História, para não incidirem
nas tolices do passado, já há muito superadas, e não cometerem o crime de
considerar como tolos, ingénuos ou farsantes os maiores cientistas do
século passado que trataram do assunto a sério, com a maior gravidade. Por
outro lado, os espíritas devem cuidar mais de sua formação doutrinária, para
não se perturbarem com a repetição de papagaiadas seculares contra a doutrina. Alfred Russell
Wallace, adversário de Darwin, estudando no
século passado as relações do Espiritismo com a
Psicologia, declarou que todas as escolas psicológicas não eram mais do que
formas de uma psicologia elementar. O trecho de Jung que
reproduzimos acima confirma essa posição de Wallace nos nossos dias. Qual o
inexperiente estudante de Psicologia actual que se atreve a contestar esses
dois gigantes?
/…
José Herculano Pires, Curso Dinâmico de Espiritismo,
VIII – Espiritismo e Psicologia, 9º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Somos as aves de fogo por sobre os campos celestes, pintura em acrílico de Costa Brites)
(imagem de contextualização: Somos as aves de fogo por sobre os campos celestes, pintura em acrílico de Costa Brites)
Sem comentários:
Enviar um comentário