Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

domingo, 5 de novembro de 2017

o grande desconhecido ~


VIII – Espiritismo e Psicologia |

Estamos na Era Psicológica, sob o signo avançado da Psi, a letra grega que designa os fenómenos parapsicológicos. Até 1930 os críticos do Espiritismo tentavam explicar os processos mediúnicos por hipóteses psicológicas. Depois dessa data, com as pesquisas de Rhine e da sua equipa, o socorro inesperado da Parapsicologia forneceu novas armas aos negadores. Tivemos o espectáculo de uma estranha euforia nos meios intelectuais: os homens de cultura proclamavam com entusiasmo a absoluta nulidade destes fenómenos. Não eram mais do que pó que se reverte ao pó. Isso era suficiente para mostrar que a consciência mundial estava muito pesada. Mas dez anos depois das difíceis investigações iniciais da Universidade de Duke, as pesquisas tomaram um ritmo acelerado e Rhine anunciou as suas absurdas descobertas: o pensamento não é físico; há no homem um conteúdo extrafísico; a mente sobrevive à morte do corpo; a percepção extra-sensorial supera todas as barreiras físicas. Vassiliev, na URSS, dispôs-se a desfazer essas balelas burguesas e fracassou no seu intento. Soal e Carington, da Universidade de Londres e Cambridge, afirmaram a sobrevivência da alma e tiveram o desplante de obter sucesso com as experiências de voz-directa (psicofonia), fenómeno em que uma entidade espiritual falava directamente, fazendo vibrar a sua voz no ar. Price, também da Universidade de Londres, teve a audácia de explicar as assombrações londrinas como manifestações de espíritos.

A última esperança das libélulas humanas, dos homens-pó, apagava-se como chama de fogo-de-artifício nas mãos dos negadores. Surgiram então os mágicos de palco e os politiqueiros de feira, sacerdotes broncos e frades ignorantes, para combater com os seus truques ingénuos aquilo mesmo que eles pregavam e que era a base do seu profissionalismo religioso: a sobrevivência da criatura humana. Esse atrevimento causou mal-estar no próprio clero, que via o seu prestígio cultural abalado perante as elites culturais. O que esses mágicos de palco semearam no mundo, através da televisão, jornais, revistas, livros, conferências e cursos pseudocientíficos, tudo isso muito rendoso financeiramente, constitui o lixo subcultural do Século XX e explica a razão das contradições espantosas da nossa época. A miséria mental desses mágicos de picadeiro encontrava ressonância nas camadas ignorantes do povo e, uma refracção espantosa, projectava a imagem da miséria cultural de figuras emplacadas nos meios universitários e eclesiásticos para o trânsito nas vias obscuras do submundo cultural. Tudo servia, como sempre, no vale-tudo da luta contra o Espiritismo. Surgiu um clarão nas trevas: a descoberta do corpo bioplásmico do homem e a prova científica da sua sobrevivência, obtida pelos cientistas soviéticos em pesquisas biofísicas na Universidade de Kirov. Na fortaleza ideológica do Materialismo Científico no mundo havia sido descoberta a realidade do corpo espiritual da tradição cristã, o perispírito da terminologia espírita, que o Apóstolo Paulo chamara com ênfase de corpo da ressurreição. A única medida possível contra isso foi logo tomada pelo oficialismo soviético, negando validade à descoberta oficialmente realizada e sustando a divulgação de novas informações a respeito. Esse contragolpe só teve, naturalmente, efeito político. Não se podia impedir o avanço irrefreável das Ciências, mas a censura soviética foi bem recebida pelos homens-pó da vacilante cultura ocidental e fez-se o silêncio desejado sobre a mais importante conquista científica do século. Os mágicos de picadeiro, jejunos em ciências, desertores da razão, intoxicados de incoerência, cantaram de galo nas brigas da ignorância.

Apesar dessa nova euforia dos adeptos do nada, esse conceito vazio, segundo Kant, as pesquisas parapsicológicas se intensificaram na URSS e em toda a órbita soviética. Na Roménia, para evitar complicações políticas aos investigadores do paranormal, forjou-se um novo nome para a Ciência de Rhine, que passou a chamar-se Psicotrónica. O nome rebarbativo funciona como cobertura táctica para os pesquisadores. Sentados comodamente no trono do psiquismoos psicotrónicos disfarçam o seu interesse de sobreviver após a morte, imitando a táctica do Prof. Raikov na Universidade de Moscovo, para pesquisar a reencarnação como simples fenómeno psicológico. Bastam essas manobras anticientíficas para provar quanto estava certo Léon Denis, numa conferência em Paris, na década de 1920, sobre o tema A Missão do Século XX. O Druida da Lorena, como Conan Doyle o chamava, previu que o nosso século seria o da vitória do Espiritismo, com a comprovação científica dos seus princípios. Aí estão as provas obtidas através de pesquisas científico-tecnológicas, ao gosto do nosso tempo. Filosófica, científica e religiosamente o Espiritismo encontrou, no nosso século, as comprovações de sua veracidade, não produzidas pelos adeptos, mas pelos seus mais poderosos adversários.

No campo psicológico, o desenvolvimento da Psicanálise, a partir de Freud, atingiu com Jung o momento crítico da revelação dos arquétipos, só possíveis nas dimensões do espírito, e por fim, a teoria das coincidências significativas (contribuição junguiana à Parapsicologia) as confissões mediúnicas do grande psicólogo nas suas memórias e a sua confiança na descoberta científica da alma. Em 1944 Jung encerrou o seu livro a respeito declarando: “Estou convencido do estudo científico da alma como ciência do futuro. A Parapsicologia é a mais jovem das Ciências Humanas e o seu desenvolvimento não foi ainda além dos primeiros passos.”

Gestalt ou Psicologia da Forma, no campo da Psicologia da Percepção, revelou o princípio de unidade formal em que se destaca o fenómeno da pregnância, e mostrou que não vivemos segundo a realidade concreta do mundo, mas segundo a nossa ilusão psicológica, dessa realidade, confirmando o princípio espírita das aparências significativas. Da conjugação dialéctica dessas duas correntes fundamentais da Psicologia contemporânea surgiu a síntese da concepção parapsicológica do homem, com o domínio do inconsciente na interpretação das percepções sensoriais, abrindo-se para as dimensões da percepção extra-sensorial. A descoberta científica do perispírito confirmou essa tese no plano objectivo, revelando de novo (em termos espíritas) a fonte secreta das captações e manifestações paranormais. O plasma físico do perispírito (corpo semimaterial, segundo Kardecé dirigido nas manifestações pelos elementos não-físicos do corpo espiritual.

Os teóricos desavisados do inconsciente, como os da escrita automática e dos fenómenos físicos da mediunidade, esquecem-se (ou nunca tomaram conhecimento) dos estudos e das pesquisas de KardecAksakof e Bozzano sobre o animismo ou manifestações da própria alma ou espírito do médium nas manifestações mediúnicas. Formulam, assim, hipóteses superadas logo no início das pesquisas espíritas, quando o próprio Freud ainda não tinha nascido.

Kardec foi também o primeiro a notar as interferências anímicas nas manifestações, por influência sugestiva e natural das lembranças antigas ou recentes do médium. Essas infiltrações (que acontecem também em plena vigília de todos nós), decorrem da lei de associação de ideias, mas são facilmente identificáveis pelos pesquisadores e as pessoas experimentadas na prática mediúnicaOchorowicz, por exemplo, chegou ao cúmulo, nas suas experiências de materialização com a médium Stanislawa, de considerar a entidade que se materializava como desdobramento material da médium. Chamava o espírito materializado de Stanislawa II. Levou, assim, a manifestação do animismo ao extremo de uma suposta divisão do organismo da médium em dois corpos diferentes. Não obstante, Stanislawa II era bem diferenciada da médium, tanto física como psicologicamente. Muitos absurdos dessa espécie foram cometidos na pesquisa espírita por cientistas rigorosos que se viam aturdidos com o acontecimento dos factos. Os psicólogos actuais, que pretendam opinar sobre questões espíritas, deviam ter a honestidade de primeiro estudar a Doutrina e a sua História, para não incidirem nas tolices do passado, já há muito superadas, e não cometerem o crime de considerar como tolos, ingénuos ou farsantes os maiores cientistas do século passado que trataram do assunto a sério, com a maior gravidade. Por outro lado, os espíritas devem cuidar mais de sua formação doutrinária, para não se perturbarem com a repetição de papagaiadas seculares contra a doutrina. Alfred Russell Wallace, adversário de Darwin, estudando no século passado as relações do Espiritismo com a Psicologia, declarou que todas as escolas psicológicas não eram mais do que formas de uma psicologia elementar. O trecho de Jung que reproduzimos acima confirma essa posição de Wallace nos nossos dias. Qual o inexperiente estudante de Psicologia actual que se atreve a contestar esses dois gigantes?

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José Herculano Pires, Curso Dinâmico de Espiritismo, VIII – Espiritismo e Psicologia, 9º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Somos as aves de fogo por sobre os campos celestes, pintura em acrílico de Costa Brites)

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