§ II Manifestações Visuais
(em Manifestações dos
Espíritos)
16. Por sua natureza e no seu estado normal, o perispírito é
invisível, tendo isso de comum com uma imensidade de fluidos que sabemos
existir, mas que nunca vimos. Pode também, como alguns fluidos, sofrer
modificações que o tornam perceptível à vista, quer por uma espécie de
condensação, quer por uma mudança na disposição molecular. Pode mesmo adquirir
as propriedades de um corpo sólido e tangível e retomar instantaneamente o seu
estado etéreo e invisível. É possível fazer-se ideia desse efeito pelo que
acontece com o vapor, que passa do estado de invisibilidade ao estado brumoso,
depois ao líquido, em seguida ao sólido e vice-versa.
Esses diferentes estados do perispírito resultam
da vontade do Espírito e não de uma causa física exterior, como se dá com
os gases. Quando um Espírito aparece, é porque ele põe o seu perispírito no
estado apropriado a tornar-se visível. Entretanto, nem sempre é suficiente só a
vontade para fazê-lo visível: é preciso, para que se opere a modificação do
perispírito, o concurso de umas tantas circunstâncias que dele independem. É,
preciso, ao demais, que ao Espírito seja permitido fazer-se visível a
tal pessoa, permissão que nem sempre lhe é concedida, ou somente o é em
determinadas circunstâncias, por razões que nos escapam. (Veja-se: O
Livro dos Médiuns, 2ª Parte, capítulo VI.)
Outra propriedade do perispírito, essa
peculiar à sua natureza etérea, é a penetrabilidade. Matéria
nenhuma lhe opõe obstáculo; ele as atravessa a todas, como a luz atravessa os
corpos transparentes. Daí vem que não há como impedir que os Espíritos
entrem num recinto inteiramente fechado. Eles visitam o preso no seu cárcere
tão facilmente como visitam a um que está no campo de trabalhar.
17. As manifestações visuais ocorrem
ordinariamente durante o sono, por meio dos sonhos: são as visões. As
aparições propriamente ditas dão-se no estado de vigília, estando
aqueles que as percebem no gozo pleno de suas faculdades e da liberdade de
usa-las. Apresentam-se, em geral, sob forma vaporosa e diáfana, algumas vezes
vaga e imprecisa. Frequentemente, não passam, à primeira vista, de um clarão
esbranquiçado, cujos contornos pouco a pouco se acentuam. Doutras vezes, as
formas apresentam-se nitidamente desenhadas, distinguindo-se os menores traços
do rosto, ao ponto de poder descrevê-lo com precisão. Os ademanes e o seu aspecto
assemelham-se aos que o Espírito tinha quando vivo.
18. Podendo assumir todas as aparências, o
Espírito se apresenta debaixo daquela que mais reconhecível o possa tornar, se
o quiser. É assim que, embora como Espírito nenhuma enfermidade corpórea lhe
reste, ele se mostrará estropiado, coxo, ferido com cicatrizes, se isso for
necessário a lhe comprovar a identidade. O mesmo se observa com relação ao
traje. O dos Espíritos que nada conservam das fraquezas terrenas, a estes de
ordinário constam amplos panos flutuantes e de uma cabeleira ondulante e
graciosa.
Amiúde os Espíritos apresentam-se com os atributos
característicos de sua elevação, como: uma auréola, asas os que podem ser
considerados anjos, resplandecente aspecto luminoso, enquanto que outros trajam
com o que recordam as suas ocupações terrestres. Assim, um guerreiro aparecerá
com a sua armadura, um sábio com os livros, um assassino com um punhal, etc. A
figura dos Espíritos superiores é bela, nobre e serena; os mais inferiores têm
qualquer coisa de feroz e bestial e, por vezes, ainda mostram vestígios dos
crimes que cometeram ou dos suplícios por que passaram, sendo-lhes essas
aparências uma realidade, isto é, julgam-se quais aparecem, o que é para eles
um castigo.
19. O Espírito que quer ou pode realizar
uma aparição toma por vezes uma forma ainda mais precisa, de semelhança
perfeita com um sólido corpo humano, de sorte a causar ilusão completa e dar a
crer que está ali um ser corpóreo.
Nalguns casos e dado certas circunstâncias, a
tangibilidade pode tornar-se real, isto é, pode tocar-se, apalpar a aparição,
senti-la resistente como um corpo vivo e com o calor que se observa neste, o
que não impede que ela se desvaneça com a rapidez do relâmpago. Pode, pois, uma
pessoa estar em presença de um Espírito, trocar com ele palavras e gestos
ordinários e supor que se trata de um simples mortal, sem suspeitar sequer que
tem diante de si um Espírito.
20. Qualquer que seja o aspecto sob que se
apresente um Espírito, ainda que sob forma tangível, pode ele, no instante em
que isso se dê, somente ser visível para algumas pessoas. Pode, pois, numa
reunião, mostrar-se, apenas, a um ou a diversos dos que nela estejam. De dois
indivíduos que se achem lado a lado, pode acontecer que um o veja e toque e o
outro nem o veja, nem o sinta.
O fenómeno da aparição a uma só pessoa, entre muitas
que se encontrem reunidas, explica-se por ser necessária, para que ele
se produza, uma combinação do fluido perispiritual do Espírito com o dessa
pessoa. E, para que isso se dê, é preciso que haja entre esses fluidos
uma espécie de afinidade que permita a combinação. Se o Espírito não
encontra a necessária aptidão orgânica, o fenómeno da aparição não pode
reproduzir-se; se existe a aptidão, o Espírito tem a liberdade de aproveitá-la
ou não. Daí resulta que, se duas pessoas igualmente dotadas quanto a essa
aptidão se encontram juntas, pode o Espírito operar a combinação fluídica
apenas com aquela das duas a quem ele se queira mostrar. Se não a operar com a
outra, esta não o verá. É como se se tratasse de dois indivíduos cujos olhos
estivessem vendados: se um terceiro quiser mostrar-se a um dos dois apenas,
somente dos olhos desse retirará a venda. A um, porém, que fosse cego, nada
adiantaria a retirada da venda: ele, por isso, não adquiriria a faculdade de
ver.
21. São muito raras as aparições tangíveis,
sendo, no entanto, frequentes as vaporosas. São-no, sobretudo, no momento da
morte. O Espírito que se libertou como que tem pressa de ir rever os seus
parentes e amigos, quiçá para avisá-los de que acaba de deixar a Terra e dizer-lhes
que continua a viver. Recorra cada um às suas lembranças e verificará
que muitos factos autênticos desse género, aos quais não foi dada a devida
atenção, ocorreram, não somente à noite, mas em pleno dia e em completo estado
de vigília.
§ III — Transfiguração. Invisibilidade
22. O perispírito das
pessoas vivas goza das mesmas propriedades que o dos Espíritos. Como já
foi dito, o daquelas não se encontra confinado no corpo: irradia e forma em
torno deste uma espécie de atmosfera fluídica. Ora, pode suceder que, em
certos casos e dadas as mesmas circunstâncias, ele sofra uma transformação
análoga à já descrita: a forma real e material do corpo se desvanece sob aquela
camada fluídica, se assim nos podemos exprimir, e tomar por momentos uma
aparência inteiramente diversa, mesmo a de outra pessoa ou a do Espírito que
combina os seus fluidos com os do indivíduo, podendo também dar a um semblante
feio um aspecto bonito e radioso. Tal é o fenómeno que se designa pelo
nome de “transfiguração”, bastante frequente e que se produz,
principalmente, quando as circunstâncias ocorrentes provocam mais abundante
expansão de fluido.
O fenómeno da transfiguração pode operar-se com intensidades
muito diferentes, conforme o grau de depuração do perispírito, grau que
sempre corresponde ao da elevação moral do Espírito. Cinge-se às vezes a
uma simples mudança no aspecto geral da fisionomia, enquanto que doutras vezes
dá ao perispírito uma aparência luminosa e esplêndida.
A forma material pode consequentemente desaparecer sob o
fluido perispirítico,
sem que se faça para isso necessário que o fluido assuma outro aspecto. Por
vezes, apenas oculta um corpo inerte ou vivo, tornando-o invisível para uma ou
para muitas pessoas, como o faria uma camada de vapor.
Tomamos as coisas actuais unicamente como termos de
comparação, sem pretendermos uma analogia absoluta, que não existe.
23. Estes fenómenos talvez pareçam singulares,
mas somente por não se conhecerem ainda as propriedades do fluido perispirítico. Este
é, para nós, um novo corpo, que há de possuir propriedades novas e que não se
podem estudar senão pelos processos ordinários da Ciência, mas que não deixam,
por isso, de ser propriedades naturais, só tendo de maravilhosa a
novidade.
/…
ALLAN KARDEC, Obras Póstumas, Primeira
Parte, Manifestações dos Espíritos, II MANIFESTAÇÕES VISUAIS, III TRANSFIGURAÇÃO.
INVISIBILIDADE, 12º fragmento solto da obra.
(imagem de contextualização: Dança rebelde, 1965
– Óleo sobre tela, de Noêmia Guerra)
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