Unidade substancial do | Universo
O Universo é uno, posto que triplo na aparência. Espírito,
Força e Matéria não parecem ser mais que os modos, os três estados de uma substância
imutável em seu princípio, variável ao infinito em suas
manifestações.
O Universo vive e respira, animado por duas correntes
poderosas: a absorção e a difusão.
Por essa expansão, por esse sopro imenso, Deus, o Ser dos
seres, a Alma do Universo, cria. Por seu amor, atrai a si. As vibrações do seu
pensamento e da sua vontade, fontes primeiras de todas as forças cósmicas,
movem o Universo e geram a Vida.
A Matéria, dissemos, é um modo, uma forma transitória da
substância universal. Ela escapa à análise e desaparece sob a objectiva dos
microscópios, para se transmudar em radiações subtis. Não tem existência
própria; as filosofias que a tomam por base repousam sobre uma aparência, uma
espécie de ilusão. (I)
A unidade do Universo, por muito tempo negada ou
incompreendida, começa a ser entrevista pela Ciência. Há duas décadas, W. Crookes, no curso de
estudos sobre a materialização dos Espíritos, descobria o quarto estado da
Matéria, o estado radiante, e essa descoberta, por suas
consequências, ia destruir todas as velhas teorias clássicas sobre o assunto.
Estas estabeleciam distinção entre a Matéria e a Força.
Sabemos agora que ambas se confundem. Sob a acção do calor, a matéria mais
grosseira se transforma em fluidos; os fluidos, por sua vez, se reduzem a um
elemento mais subtil, que escapa aos nossos sentidos. Toda matéria pode ser
transformada em força e toda força se condensa em matéria, percorrendo assim um
círculo incessante. (II)
As experiências de Crookes prosseguiram e foram confirmadas
por uma legião de investigadores. O mais célebre, Roentgen,
denominou raios X as irradiações emanadas das ampolas de vidro; têm eles a
propriedade de atravessar a maior parte dos corpos opacos e permitem perceber e
fotografar o invisível aos nossos olhos.
Pouco depois, o Sr. Becquerel demonstrava
as propriedades que têm certos metais de emitir irradiações obscuras, que
penetram a matéria mais densa, quais os raios Roentgen, e impressionam as
placas fotográficas através das lâminas metálicas.
O rádium, descoberto pelo Sr. Curie, produz calor e
luz, de maneira contínua, sem se esgotar de modo sensível. Os corpos submetidos
à sua acção se tornam por sua vez irradiantes. Posto que a quantidade de
energia irradiada por esse metal seja considerável, a perda de substância
material que lhe corresponde é quase nula. W. Crookes calculou que um século
seria necessário para a dissociação de um grama de rádium. (III) Mais ainda: as
engenhosas descobertas de G. Le Bom (IV)
provaram que as irradiações são uma propriedade geral de todos
os corpos. A matéria pode dissociar-se indefinidamente; ela é
energia concretizada. Assim, a teoria do átomo indivisível, que há dois
milénios servia de base à Física e à Química, desmorona-se e, com ela, as
distinções clássicas entre o ponderável e o imponderável. (V) A soberania da
Matéria, que se dizia absoluta, eterna, teve fim.
É preciso, pois, reconhecer que o Universo não é tal como
parecia aos nossos fracos sentidos. O mundo físico constitui ínfima
parte dele. Fora do círculo de nossas percepções existe uma infinidade
de forças e de formas subtis que a Ciência ignorou até hoje. O domínio do
invisível é muito mais vasto e mais rico que o do mundo visível. Em sua análise
dos elementos que constituem o Universo, a Ciência tem errado durante séculos,
e agora lhe é necessário destruir o que tão penosamente edificou. O dogma
científico da unidade irredutível do átomo, desmoronando-se, arrasta todas
as teorias materialistas. A existência dos fluidos, afirmada pelos
Espíritos há meio século – o que lhes valeu tantos sarcasmos
da parte dos sábios oficiais –, está estabelecida, doravante, pela
experimentação, de maneira rigorosa.
Os seres vivos, por sua parte, emitem irradiações de
naturezas diferentes. Eflúvios humanos, variando de forma e de
intensidade sob a acção da vontade, impregnam placas com misteriosa
luz. Esses influxos, quer nervosos, quer psíquicos, conhecidos desde muito
pelos magnetizadores e espíritas, mas negados pela Ciência, são autenticados
hoje pelos fisiologistas, no grau de realidade irrecusável. Por esse caminho é
encontrado o princípio da telepatia. As volições do pensamento, as projecções da
vontade, transmitem-se através do Espaço, quais as vibrações do
som e as ondulações da luz, e vão impressionar organismos em
simpatia com o do emitente. As Almas em afinidade de
pensamento e de sentimento podem trocar seus eflúvios, em todas as distâncias,
de igual maneira que os astros permutam, através dos abismos do Espaço,
seus raios trémulos. Descobrimos ainda aí o segredo das ardentes
simpatias ou das invencíveis repulsões que certos homens
sentem uns pelos outros, à primeira vista.
A maior parte dos problemas psicológicos – sugestão,
comunicação à distância, acções e reacções ocultas, visão através de obstáculos
– encontram aí a sua explicação. Estamos ainda na aurora do verdadeiro
conhecimento, mas o campo das pesquisas se acha largamente aberto e a Ciência
vai marchar, de conquista em conquista, em senda rica de surpresas. O mundo
invisível se revela a própria base do Universo, a fonte eterna das
energias físicas e vitais que animam o Cosmos.
Rui assim o principal argumento daqueles que negam a
possibilidade da existência dos Espíritos, dos que não podiam conceber a vida
invisível, por falta de um substrato, de uma substância que escapa aos nossos
sentidos. Ora, nós encontramos, conjuntamente, no mundo dos imponderáveis, os
elementos constitutivos da vida desses seres e as forças que lhes são
necessárias para manifestar sua existência.
Os fenómenos espíritas, de toda ordem, explicam-se pelo
facto de que um dispêndio considerável de energia pode produzir-se sem
dispêndio aparente de matéria. Os transportes, a desagregação e
a reconstituição espontâneos de objectos, em câmaras fechadas;
os casos de levitação; a passagem dos Espíritos através dos corpos
sólidos; aparições e materializações, que provocaram
tanta admiração e suscitaram tantos sarcasmos; tudo isso se torna fácil de
compreender, desde que se conheça o jogo das forças e dos
elementos em acção nesses fenómenos. De tal dissociação de matéria, de que fala
G. Le Bon e que o homem é ainda impotente para produzir, os Espíritos possuem,
de há muito, as regras e as leis. A aplicação dos raios X não explica
também o fenómeno da dupla vista dos médiuns e o da fotografia
espírita? Com efeito, se as placas podem ser influenciadas por certos raios
obscuros, por diversas irradiações de matéria imponderável, que penetram os
corpos opacos, maior e mais forte razão existe para que os fluidos
quintessenciados do envoltório dos Espíritos possam, em determinadas
condições, impressionar a retina dos videntes, aparelho mais delicado e mais
complexo que a placa de vidro.
É assim que o Espiritismo se fortalece cada dia, pela
aquisição de argumentos tirados das descobertas da Ciência, e que acabarão por
abalar os mais endurecidos cépticos.
/…
(I) “A matéria, diz W. Crookes, é um modo do movimento.” (Proc.
Roy. Soc., nº 205, pág. 472.).
(II) “Toda matéria – diz Crookes – tornará a passar pelo
estado etéreo de onde veio.” (Discurso no Congresso de Química, de Berlim,
1901).
(III) Vide G. Le Bon, Revue Scientifique, 24 de
Outubro de 1903, pág. 518.
(IV) Vide Revue Scientifique, 17, 24 e 31 de
Outubro de 1903.
(V) Desde séculos, afirmava-se e defendia-se a teoria dos
átomos, sem que a conhecessem perfeitamente. Berthelot a
qualifica de “romance engenhoso e subtil”. (Berthelot – La
Synthese Chimique, 1876, p. 164.) Por aí se vê – diz Le Bon – que certos
dogmas científicos não têm mais consistência que as divindades dos antigos
tempos.
Léon Denis, O Grande Enigma, Primeira parte Deus
e o Universo, II Unidade substancial do Universo 1 de 2, 9º
fragmento da obra.
(imagem: As majestosas e violentas palavras dos poemas, pintura em
acrílico de Costa Brites)
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