Natureza Moral da
Terapia Espírita
A natureza moral da terapêutica espírita decorre da moral de
Jesus, pura e natural, desprovida dos aparatos, rituais e ordenações
antinaturais forjadas pelos teólogos. Por isso a terapia espírita, como a de
Jesus, não se funda em práticas sacrificiais, em exorcismos demoníacos, em
condenações da função genésica do homem e da mulher, mas na liberdade regida
pelos princípios básicos da consciência humana, onde – e somente nela – estão
inscritas as verdadeiras leis morais da humanidade.
Os atos naturais, exigidos pela própria continuidade da espécie humana, capitulados como pecados veniais e capitais nas tabelas de preços das indulgências, que provocaram a revolta de Lutero, não são considerados como crimes contra a Divindade. Crimes são os abusos e as perversões desses atos, que nivelam o homem aos animais. Mas a educação é o antídoto desses desvios – a educação natural de Rousseau, desenvolvida em suas técnicas por Pestalozzi e seu discípulo e sucessor Allan Kardec. Pestalozzi era deísta e universalista, educador por excelência, o homo faber da educação nos séculos XVIII e XIX, mas faltava-lhe a vocação pedagógica, que sobrava a Kardec. Em Kardec havia o doublé de filósofo e cientista, as duas vocações necessárias ao fazer pedagógico, que implica a reflexão global sobre a educação e a complementação experimental da pesquisa científica. Mergulhado nesses dois planos da realidade educativa, Kardec ansiava pela descoberta da essência do homem, da sua natureza última e do seu destino. Entendia, como declarou tantas vezes, que sem esse conhecimento não podíamos conhecer realmente o educando e dar-lhe, por uma educação adequada, o pleno desenvolvimento de suas potencialidades.
Entregou-se primeiro às pesquisas do magnetismo *, que lhe revelava um novo aspeto da natureza humana, e mais tarde, ante a insistência de amigos, ao estudo e à pesquisa dos fenómenos paranormais, que na época explodiam por toda parte. Foi esse o caminho que o levou ao Espiritismo, num verdadeiro ato de amor, para usarmos a expressão de Hubert.
Emparelhou-se casualmente com a revolução teológica de Kierkegaard, que fundava na Dinamarca, sem querer, a Filosofia Existencial. Sua tendência platónica levou-o a sonhar com a República de Platão em termos universais, através da educação integral do homem, no desenvolvimento de toda a sua perfetibilidade possível, como queria Kant e como querem ainda hoje os neokantianos do realismo crítico. Essa a relação sensível existente entre a pedagogia de Hubert e Kerchensteiner com a Pedagogia Espírita entranhada na obra kardeciana. O princípio grego da unidade orgânica do Universo decorre de uma visão lógica superior. A Psicologia Infantil nos mostra que a perceção da criança em suas primeiras fases de desenvolvimento é fragmentária. O mesmo ocorre com os povos primitivos que se isolam no seu torrão e na tribo com a arrogância de únicos habitantes do mundo. Essa incapacidade natural de uma conceção ampla gera o orgulho do exclusivismo racista, da xenofobia, das cidades e das civilizações muradas do geocentrismo e do antropocentrismo. Só o desenvolvimento da civilização, à maneira do desenvolvimento orgânico e da sociabilidade na criança, abre perspetivas para a mente fechada. Os gregos passaram também por esse processo, mas, auxiliados pela sua posição geográfica e por uma capacidade de abstração mental superior, mostraram-se mais avançados, conseguindo imaginar o mundo como uma unidade orgânica e viva, como vemos na sua teoria do ilosoísmo **.
Do outro lado do mundo estavam os celtas, que foram capazes de imaginar o universo hipostásico dos círculos superpostos de Anunf, o círculo infernal; Abred, o círculo das reencarnações; Gwinfid, o círculo divino ou Morada de Deus. Bastaria esses dois exemplos para mostrar a necessidade das migrações entre os mundos habitados no cosmos segundo o princípio espírita.
O aparecimento do indivíduo em Atenas não decorreu do comércio do Mar Egeu, mas do único milagre grego que se pode admitir: a avançada capacidade grega de abstração.
Sócrates, que partilhou da leviandade dos sofistas, abandonou-os ao perceber o vazio de suas teorias e fundou a Filosofia Moral. O moralismo socrático preparou, à distância da corriola rabínica dos sofistas judeus o advento do Cristianismo. Kardec reconheceu essa função precursora de Sócrates e Platão e comparou o estágio evolutivo dos gregos ao dos celtas, que Aristóteles considerou o único povo filósofo do mundo. Note-se bem: um povo filósofo, que os romanos conquistaram para se apoderarem de sua sabedoria. Esse apanhado sucinto e fragmentário dos mundos grego e celta mostra a razão da superioridade da moral espírita, que Kardec desenvolveu na França do iluminismo e da liberdade.
Os atos naturais, exigidos pela própria continuidade da espécie humana, capitulados como pecados veniais e capitais nas tabelas de preços das indulgências, que provocaram a revolta de Lutero, não são considerados como crimes contra a Divindade. Crimes são os abusos e as perversões desses atos, que nivelam o homem aos animais. Mas a educação é o antídoto desses desvios – a educação natural de Rousseau, desenvolvida em suas técnicas por Pestalozzi e seu discípulo e sucessor Allan Kardec. Pestalozzi era deísta e universalista, educador por excelência, o homo faber da educação nos séculos XVIII e XIX, mas faltava-lhe a vocação pedagógica, que sobrava a Kardec. Em Kardec havia o doublé de filósofo e cientista, as duas vocações necessárias ao fazer pedagógico, que implica a reflexão global sobre a educação e a complementação experimental da pesquisa científica. Mergulhado nesses dois planos da realidade educativa, Kardec ansiava pela descoberta da essência do homem, da sua natureza última e do seu destino. Entendia, como declarou tantas vezes, que sem esse conhecimento não podíamos conhecer realmente o educando e dar-lhe, por uma educação adequada, o pleno desenvolvimento de suas potencialidades.
Entregou-se primeiro às pesquisas do magnetismo *, que lhe revelava um novo aspeto da natureza humana, e mais tarde, ante a insistência de amigos, ao estudo e à pesquisa dos fenómenos paranormais, que na época explodiam por toda parte. Foi esse o caminho que o levou ao Espiritismo, num verdadeiro ato de amor, para usarmos a expressão de Hubert.
Emparelhou-se casualmente com a revolução teológica de Kierkegaard, que fundava na Dinamarca, sem querer, a Filosofia Existencial. Sua tendência platónica levou-o a sonhar com a República de Platão em termos universais, através da educação integral do homem, no desenvolvimento de toda a sua perfetibilidade possível, como queria Kant e como querem ainda hoje os neokantianos do realismo crítico. Essa a relação sensível existente entre a pedagogia de Hubert e Kerchensteiner com a Pedagogia Espírita entranhada na obra kardeciana. O princípio grego da unidade orgânica do Universo decorre de uma visão lógica superior. A Psicologia Infantil nos mostra que a perceção da criança em suas primeiras fases de desenvolvimento é fragmentária. O mesmo ocorre com os povos primitivos que se isolam no seu torrão e na tribo com a arrogância de únicos habitantes do mundo. Essa incapacidade natural de uma conceção ampla gera o orgulho do exclusivismo racista, da xenofobia, das cidades e das civilizações muradas do geocentrismo e do antropocentrismo. Só o desenvolvimento da civilização, à maneira do desenvolvimento orgânico e da sociabilidade na criança, abre perspetivas para a mente fechada. Os gregos passaram também por esse processo, mas, auxiliados pela sua posição geográfica e por uma capacidade de abstração mental superior, mostraram-se mais avançados, conseguindo imaginar o mundo como uma unidade orgânica e viva, como vemos na sua teoria do ilosoísmo **.
Do outro lado do mundo estavam os celtas, que foram capazes de imaginar o universo hipostásico dos círculos superpostos de Anunf, o círculo infernal; Abred, o círculo das reencarnações; Gwinfid, o círculo divino ou Morada de Deus. Bastaria esses dois exemplos para mostrar a necessidade das migrações entre os mundos habitados no cosmos segundo o princípio espírita.
O aparecimento do indivíduo em Atenas não decorreu do comércio do Mar Egeu, mas do único milagre grego que se pode admitir: a avançada capacidade grega de abstração.
Sócrates, que partilhou da leviandade dos sofistas, abandonou-os ao perceber o vazio de suas teorias e fundou a Filosofia Moral. O moralismo socrático preparou, à distância da corriola rabínica dos sofistas judeus o advento do Cristianismo. Kardec reconheceu essa função precursora de Sócrates e Platão e comparou o estágio evolutivo dos gregos ao dos celtas, que Aristóteles considerou o único povo filósofo do mundo. Note-se bem: um povo filósofo, que os romanos conquistaram para se apoderarem de sua sabedoria. Esse apanhado sucinto e fragmentário dos mundos grego e celta mostra a razão da superioridade da moral espírita, que Kardec desenvolveu na França do iluminismo e da liberdade.
Curar e educar são funções conjugadas do homem na luta pela
sua transcendência. Por isso, Kardec as reuniu em suas primeiras atividades em
Paris, tendo exercido a medicina, como assinala André Moreil, confirmando as
informações de Henry Sausse, primeiro biógrafo de Kardec e contemporâneo do
mestre. Moreil menciona o período em que Kardec exerceu medicina em Paris. Ficou assim
anulada a dúvida que se levantou sobre as suas atividades médicas. Por outro
lado, é pacífico que ele lecionou ciências médicas em Paris . Era uma
inteligência omnímoda e se empenhava com afinco na decifração dos mistérios do
homem. Sua maior realização foi a criação da Ciência Espírita. Ela lhe custou
muito caro, pois teve de enfrentar sozinho uma batalha sem tréguas com todas as
forças culturais, religiosas, políticas e sociais do seu tempo. Seu senso e sua
moralidade comprovam-se atualmente na volumosa obra que deixou como o alicerce
inabalável da Ciência e da Filosofia Espírita.
/…
* mais tarde chamado, hipnotismo...
** pré socrática, materialista ou ilosoísta...
* mais tarde chamado, hipnotismo...
** pré socrática, materialista ou ilosoísta...
José Herculano Pires, Ciência
Espírita e suas implicações terapêuticas, 3
Natureza Moral da Terapia Espírita 3 de 3, 10º fragmento da
obra.
(imagem: O peregrino sobre o mar de névoa, por Caspar David Friedrich)
(imagem: O peregrino sobre o mar de névoa, por Caspar David Friedrich)
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