Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

pensamento espírita argentino ~


CAPÍTULO I

Fundamentos científicos da concepção neo-espírita da vida e da história ~

Que somos?

Há vinte e quatro séculos (470 a.C.), o imortal Sócrates viu inscrita na fachada do templo de Delfos esta profunda sentença: “Conhece-te a ti mesmo”, que tomou como fundamento da sua filosofia. Transcorreram os séculos sem que a humanidade, absorvida pelos interesses da vida material, se preocupasse com aquela afirmação. Conhecer-se a si mesmo: saber o que somos, de onde viemos e para onde vamos! Eis aí o problema, o formidável problema, que inclui o princípio da verdadeira sabedoria.

As religiões e as diversas filosofias perderam-se em conjecturas, numa metafísica infecunda e cheia de contradições, sem nos dar a chave do problema: o Nosce te ipsum (Conhece-te a ti mesmo) guardava a sua incógnita.

O positivismo materialista, iludido pelas falsas perspectivas de um conhecimento incompleto, acreditou conhecer o homem, estudando-o: com a biologia, no desenvolvimento da célula e no processo biológico, do óvulo fecundado até ao completo desenvolvimento do seu complicado organismo; com a fisiologia e a anatomia, no funcionamento orgânico e estrutura celular; com a histologia, na delicada constituição dos seus tecidos, das suas fibras e neurónios; com a química, na composição íntima dos seus elementos constitutivos e, com a antropologia, nas suas relações de origem e descendência, nas influências hereditárias etnológicas, mesológicas, etc.; e como não pôde agarrar a alma com o bisturi, descobri-la nas suas análises químicas, nem vê-la desprender-se do organismo no momento da morte, passou-lhe atestado de óbito, dando o problema por solucionado, concluindo que não há pensamento sem cérebro, nem percepção sem órgãos materiais, nem alma individual ou sobrevivência anímica, e o conhece-te a ti mesmo ficou prejudicado perante o conceito da ciência materialista.

Mas eis que “os mortos se levantam dos seus túmulos” e, enquanto os seus corpos se decompõem e os elementos constitutivos se desagregam e se infiltram na terra, dando vida às plantas e aos insectos que os circundam e deles adquirem corpo e se nutrem, a entidade psíquica, o eu espiritual que constitui a nossa verdadeira personalidade, vive, sente, pensa e actua num plano de vida superior, rodeado, ou melhor dizendo, revestido de um corpo etéreo, verdadeiro receptáculo das energias sensoriais e psíquicas e o potencial gerador das forças vitais, sensitivas e motoras, vínculo perispiritual, indispensável para a manifestação das nossas faculdades anímicas e espirituais e para a relação entre o espírito e a matéria, segundo se depreende dos factos acumulados pela psicologia experimental, pela metapsíquica e pelo Espiritismo.

Necessitava-se, pois, para que se resolvesse o problema do conhecimento do ser, dos factos e manifestações espíritas, capazes de explicar todo o alcance da sentença socrática.

Sábios de grande renome, mestres em todas as ciências, pensadores profundos, robustas mentalidades que se têm destacado em todos os ramos do saber humano, abraçaram o estudo do Espiritismo e depois de largas e pacientes investigações, de contínuas experiências e de terem acumulado enorme caudal de factos, que formam hoje um mosaico variado das suas manifestações e detalhes como sólido na base do conjunto, capaz de resistir aos embates da crítica mais minuciosa e exigente, provaram, positivamente, que a alma é uma entidade substancial, que pode actuar dentro e fora do organismo e, em circunstâncias determinadas e condições psíquicas especiais, ver sem os olhos e ouvir sem os ouvidos, não por uma hiperestesia do sentido da visão ou da audição, mas por um sentido interior, psíquico, mental; que pode, enfim ter pressentimentos e visões telepáticas verídicas, ver, em estado sonambúlico, através dos corpos opacos e a muitos quilómetros de distância e descrever minuciosamente o que se está a passar, desprender-se parcial ou totalmente do seu corpo material, e perante a destruição deste, manifestar-se no mundo dos vivos, de diferentes modos, valendo-se ou não do organismo de um médium.

As experiências do físico William Crookes, descobridor da matéria radiante, do tálio e inventor dos tubos que levam o seu nome, as do físico não menos célebre Cromwell Varley, inventor do condensador eléctrico; as do naturalista Alfred Russel Wallace, autor da teoria da selecção natural (simultaneamente com Darwin), as do fisiólogo Charles Richet, as do antropólogo-criminalista Cesare Lombroso, as do ilustre físico Oliver Lodge, as do professor Ernesto Bozzano, as dos astrónomos ZöllnerFlammarion, Porro (do Observatório de La Plata), Schiaparelli etc., as dos doutores Otero Acevedo, GibierGustave Geley, dos Osty, Hamilton, Schrenck Notzing, as dos psicólogos da importância de William James, de Weber e Fechner, as de Aksakof e mil outras, realizadas por sábios de fama mundial, sobram em factos tão rigorosamente controlados, que provam por si sós a verdade das afirmações precedentes.

Seria difícil dar aqui uma ideia, ainda que aproximada, da quantidade e variedade dos fenómenos psíquicos supranormais que registaram os anais do Espiritismo. Desde meados do século passado até aos nossos dias, se têm acumulado tantos factos em favor da tese espírita que só a ignorância, o misoneísmo ou a negação sistemática poderão desconhecê-los ou atribuí-los a sofisticações ou fraudes.

Outros sábios, outros homens, ávidos de conhecer o mistério do além-túmulo, enquanto a caravana do mundo se agita no torvelinho de suas paixões e interesses materiais, seguem esquadrinhando serena e silenciosamente as sombras do além e tratam, por todos os meios ao seu alcance, de furar o túnel da morte e chegar ao pleno conhecimento do mundo espiritual. Dos seus trabalhos pacientes, perseverantes, assaz ásperos e um tanto ingratos, há hoje indícios seguros dessa nova vida que se estende além do plano terrestre, a um mundo infinito que nos assedia e do qual até agora temos tido apenas presunções. Vozes amigas, palavras de consolo, lembranças longínquas, lamentos, remorsos, ódios inauditos, carícias, recriminações, almas que sentem e pensam, testemunhos patentes de seres que viveram e vivem ainda acreditando-se ligados à terra, chegam através desse grande túnel, aberto por quase um século de investigação científica, a anunciar-nos a aurora de um glorioso despertar, cheio de agradáveis e fundadas perspectivas, de alentadoras esperanças.

Nunca como na nossa época se sentiu a imperiosa necessidade de descerrar o véu do desconhecido; jamais esta ansiedade da alma foi tão funda e absorvente como neste século, em que os conhecimentos mais positivos se sentem fraquejar na sua própria base perante os grandes e maravilhosos descobrimentos da ciência contemporânea e a observação audaz e penetrante da filosofia. Dir-se-ia que chegaram os tempos da revelação científica das eternas verdades que alentaram a humanidade desde a infância.

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Manuel S. Porteiro (i)Espiritismo Dialéctico, CAPÍTULO I Fundamentos científicos da concepção neo-espírita da vida e da história, – Que somos? 1º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Cada Mañana, óleo sobre tela (1968) de Josefina Robirosa | MUSEO DE LA SOLIDARIDAD SALVADOR ALLENDE (i))

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