Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

quarta-feira, 22 de junho de 2022

Hippolyte Léon Denisard Rivail


Teoria das Manifestações Físicas 
(Segundo Artigo) 

Pedimos aos nossos leitores o favor de se reportarem ao primeiro artigo que publicámos acerca deste assunto (*); sendo este a sua continuação, seria pouco inteligível se não se tivesse em mente aquele início. 

As explicações que demos sobre as manifestações físicas, como dissemos, fundam-se sobre a observação e a dedução lógica dos factos: concluímos de acordo com o que vimos. Agora, como se operam, na matéria eterizada, as modificações que vão torná-la perceptível e tangível? Deixemos, primeiro, que falem os Espíritos, a quem interrogamos a este respeito, acrescentando depois os nossos próprios comentários. As respostas seguintes foram dadas pelo Espírito São Luís e; concordam com o que nos havia sido dito anteriormente por outros Espíritos. 

1. Como pode um Espírito aparecer com a solidez de um corpo vivo? 

Resp. – Ele combina uma parte do fluido universal com o fluido que o médium liberta, próprio a esse efeito. À sua vontade, esse fluído toma a forma que o Espírito deseja; mas em geral a forma é impalpável. 

2. Qual é a natureza desse fluido? 

Resp. – Fluido; está tudo dito. 

3. Esse fluido é material? 

Resp. – Semimaterial. 

4. É esse fluido que compõe o perispírito

Resp. – Sim, é a ligação do Espírito à matéria. 

5. É esse fluido que dá vida, ao princípio vital

Resp. – Sempre ele; eu disse ligação. 

6. Esse fluido é uma emanação da Divindade? 

Resp. – Não. 

7. É uma criação da Divindade? 

Resp. – Sim, tudo é criado, excepto o próprio Deus. 

8. O fluido universal tem alguma relação com o fluido eléctrico, do qual conhecemos os efeitos? 

Resp. – Sim; é um seu elemento. 

9. A substância etérea que existe entre os planetas é o fluido universal em questão? 

Resp. – Ele envolve os mundos: sem o princípio vital, nada viveria. Se um homem se elevasse além do envoltório fluídico que circunda os globos, pereceria, porquanto o princípio vital dele se retiraria, para se juntar à massa. Esse fluido vos anima; é ele que respirais. 

10. Esse fluido é o mesmo em todos os globos? 

Resp. – É o mesmo princípio, mais ou menos eterizado, conforme a natureza dos globos; o vosso é um dos mais materiais. 

11. Desde que é esse fluido que compõe o perispírito, estaria ele em uma espécie de condensação que, até certo ponto, o aproxima da matéria? 

Resp. – Até um certo ponto, sim, visto não ter as suas propriedades; é mais ou menos condensado, conforme os mundos. 

12. São os Espíritos solidificados que erguem uma mesa? 

Resp. – Essa pergunta não levará ainda ao que desejais. Quando uma mesa se move sob as vossas mãos, o Espírito evocado pelo vosso Espírito vai haurir, do fluido cósmico universal, aquilo com que haverá de animar essa mesa com uma vida factíciaOs Espíritos que produzem tais efeitos são sempre Espíritos inferiores, ainda não inteiramente desprendidos do seu fluido ou perispírito. Estando assim preparada à sua vontade – à vontade dos Espíritos batedores – o Espírito a atrai e a movimenta, sob a influência do seu próprio fluido, liberado pela sua vontade. Quando a massa que deseja levantar ou mover lhe é demasiado pesada, chama em seu auxílio Espíritos que se encontram nas mesmas condições que ele. Creio que me expliquei com bastante clareza para me fazer compreender. 

13. Os Espíritos que ele chama em seu auxílio são inferiores? 

Resp. – Quase sempre são iguais; frequentemente vêm por si mesmos. 

14. Compreendemos que os Espíritos superiores não se ocupem de coisas que estão abaixo deles; mas perguntamos, em virtude de serem desmaterializados, se teriam o poder de o fazer, caso tivessem essa vontade? 

Resp. – Têm a força moral, como os outros têm a força física; quando necessitam desta última, servem-se dos que a possuem. Não se vos disse que eles se servem dos Espíritos inferiores como o fazeis com os carregadores? 

15. De onde vem o poder especial do Sr. Home

Resp. – De sua organização. 

16. Que tem ela de particular? 

Resp. – Essa pergunta não está clara. 

17. Perguntamos se se trata de sua organização física ou moral. 

Resp. – Eu disse organização. 

18. Entre as pessoas presentes há alguém que possa ter a mesma faculdade do Sr. Home

Resp. – Têm-na em certo grau. Não foi um de vós que fez mover a mesa? 

19. Quando uma pessoa faz mover um objecto, é sempre pelo concurso de um Espírito estranho, ou a acção pode provir somente do médium

Resp. – Algumas vezes o Espírito do médium pode agir sozinho, porém, na maioria das vezes, é com o auxílio dos Espíritos evocados; isso é fácil de reconhecer. 

20. Como é que os Espíritos aparecem com as roupas que usavam na Terra? 

Resp. – Delas muitas vezes só têm a aparência. Aliás, quantos fenómenos sem solução não tendes entre vós? Como pode o vento, que é impalpável, arrancar e quebrar árvores, que são compostas de matéria sólida? 

21. Que entendeis quando afirmais que essas roupas têm apenas a sua aparência? 

Resp. – Ao tocá-las nada se sente. 

22. Se bem compreendemos o que nos dissestes, o princípio vital reside no fluido universal; o Espírito haure nesse fluido o envoltório semimaterial que constitui o seu perispírito e, é por meio desse fluido que ele age sobre a matéria inerte. É mesmo isso? 

Resp. – Sim; isto é, ele anima a matéria com uma espécie de vida factícia; a matéria se anima da vida animal. A mesa que se move sob as vossas mãos vive e sofre como o animal; obedece por si mesma ao ser inteligente. Não é ele que a dirige, como o homem com um fardo; quando a mesa se ergue, não é o Espírito que a levanta, é a mesa animada que obedece ao Espírito inteligente. 

23. Desde que o fluido universal é a fonte da vida, é, ao mesmo tempo, a fonte da inteligência? 

Resp. – Não; o fluido anima somente a matéria. 

Esta teoria das manifestações físicas oferece vários pontos de contacto com a que demos, mas dela difere sob certos aspectos. De uma e da outra ressalta um ponto capital: o fluido universal, no qual reside o princípio da vida, é o agente principal dessas manifestações e esse agente recebe a sua impulsão do Espírito, quer seja encarnado ou errante. Esse fluido condensado constitui o perispírito ou envoltório semimaterial do Espírito. Quando encarnado, o perispírito está unido à matéria do corpo; no estado de erraticidade, fica livre. Ora, duas questões se apresentam aqui: a da aparição dos Espíritos e a do movimento imprimido aos corpos sólidos. 

Em relação à primeira, diremos que, no estado normal, a matéria eterizada do perispírito escapa à percepção dos nossos órgãos; só a alma pode vê-la, quer em sonho, quer em estado sonambúlico ou, até mesmo, semi-adormecida; numa palavra, toda a vez em que houver suspensão total ou parcial da actividade dos sentidos. Quando o Espírito está encarnado, a substância do perispírito se encontra mais ou menos ligada intimamente à matéria do corpo, mais ou menos aderente, se assim nos podemos exprimir. Em algumas pessoas há uma espécie de emanação desse fluido, em consequência de sua organização e, é isso que constitui propriamente os médiuns de efeitos físicos. Emanando do corpo, esse fluido se combina, segundo leis que nos são desconhecidas, com o fluido que forma o envoltório semimaterial de um Espírito estranho. Disso resulta uma modificação, uma espécie de reacção molecular que lhe altera momentaneamente as propriedades, ao ponto de torná-lo visível e, em certos casos, tangível. Esse efeito pode produzir-se com ou sem o concurso da vontade do médium; é isso que distingue os médiuns naturais dos médiuns facultativos. A emissão do fluido pode ser mais ou menos abundante: daí os médiuns mais ou menos potentes; e como tal emissão não é permanente, fica explicada a intermitência daquele poder. Enfim, se se levar em conta o grau de afinidade que pode existir entre o fluido do médium e o de tal ou qual Espírito, conceber-se-á que a sua acção possa exercer-se sobre uns e não sobre outros. 

Evidentemente, o que acabamos de dizer também se aplica à força mediúnica, no que concerne ao movimento dos corpos sólidos; resta saber como se opera esse movimento. Conforme as respostas que relatamos acima, a questão se apresenta sob uma luz inteiramente nova; assim, quando um objecto é posto em movimento, erguido ou lançado no ar, não é o Espírito que o agarra, empurra e levanta, como o faríamos com a mão; ele, por assim dizer, o satura com o seu fluido, combinando-o com o do médium e, o objecto, assim momentaneamente vivificado, age como o faria um ser vivo, com a diferença de que, não tendo vontade própria, segue a impulsão da vontade do Espírito, tanto podendo essa vontade ser do Espírito do médium quanto de um Espírito estranho e, algumas vezes, dos dois, agindo de comum acordo, conforme sejam ou não simpáticos. A simpatia ou antipatia que pode existir entre os médiuns e os Espíritos que se ocupam desses efeitos materiais explica por que nem todos são aptos a provocá-los. 

Desde que o fluido vital, emitido de alguma sorte pelo Espírito, dá uma vida factícia e momentânea aos corpos inertes; desde que outra coisa não é o perispírito senão o próprio fluido vital, segue-se que, quando encarnado, é o Espírito que dá vida ao corpo, por intermédio do seu perispírito; fica-lhe unido enquanto a organização o permite; quando se retira, o corpo morre. Agora, se em vez de uma mesa, talhamos uma estátua em madeira e, se agirmos sobre ela como sobre a mesa, teremos uma estátua que se movimentará, que baterá, que responderá por movimentos e pancadas; numa palavra, uma estátua momentaneamente animada de uma vida artificial. Quanta claridade lança esta teoria sobre uma multidão de fenómenos até aqui inexplicados! Quantas alegorias e efeitos misteriosos ela explica! É toda uma filosofia. 

/… 
(*) Conforme indicação do autor, entre por favor aqui, onde acederá ao seu primeiro artigo, por nós já publicado e, assim beneficiarmos a sua inteligibilidade. Nota desta publicação. 


Allan Kardec (i), aliás, Hippolyte Léon Denisard Rivail, Teoria das Manifestações Físicas, Segundo Artigo. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos, Paris, Junho de 1858, 14º fragmento da Revista objecto do presente titulo desta publicação. 
(imagem de contextualização: Dança rebelde, 1965 – Óleo sobre tela, de Noêmia Guerra

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