Parte X
Quarta lição
– A música humana e as notas harmónicas
– A música celeste
– Os sons e as cores
(Novembro de 1922)
“Falaremos hoje da sonoridade, não da sonoridade pura porque
não distinguimos os sons com precisão. O som resulta de uma vibração que
impressiona os nossos órgãos psíquicos e produz, por consequência, um fenómeno
virtual.
É preciso partir deste princípio: no espaço, o som não
será a sensação de um ruído, mas a sensação que uma satisfação de bem-estar
moral e espiritual produz. O prazer é mais ou menos intenso e corresponde às
sensações que os instrumentos nos causam na Terra.
Vimos o ser imaterial transportado para a
esfera musical, isto é, para o campo vibratório (i), animado por seres angélicos;
vimos também que esse ser recebe, no seu perispírito (i), vibrações
que, ao se chocarem com os seus próprios eflúvios, produzirão sensações de
prazer.
Na música humana, vós tendes o lá como nota do
diapasão (ii); não tomaremos essa nota como ponto de partida porque
a sua tonalidade não corresponde à tonalidade das cores. Tomaremos
o dó. O dó, aos vossos ouvidos, produz um som grave, pleno, e que exprime o
regozijo, um som que representa bem o amor que devemos sentir por Deus.
Esse dó, se fizermos uma comparação, adapta-se melhor à primeira das sensações
fluídicas, que se traduz geralmente pela cor azul.
O dó simboliza o azul celeste, a quietude,
a paz da alma proporcionada pela prece. O dó é a primeira nota
do acorde perfeito que deriva do azul.
O mi representa a força no
amor, a vontade de amar, e pode ser representado por um raio da vossa luz
solar. Temos, então: dó, mi. O dó fundamental
é azul; o mi, a vontade no amor, nos dará o azul celeste e o ouro.
O sol, terceira nota harmónica, representa a
consolidação das duas notas precedentes, ou seja, uma ligação que pontua as
duas ideias precedentes emitidas, pontuação que assegura a
exteriorização do sentimento dado pelo azul.
Percebemos essa nota por uma tonalidade especial,
da qual eu procuro fazer-vos compreender a cor pelos vossos sentidos. Não
é nem uma emanação prateada, que poderia confundir-se com o ouro, ser por ele
absorvida, nem uma emanação negra, resultante de outras cores, que poderia
absorver o azul. Mas é um fluido brilhante, sem cor bem definida, que pode
aproximar-se da luz radiante (i) que se desprende
dos mundos que vós percebeis, ou seja, cinza-azulado, cinza-prateado. O vosso
Sol, visto de longe, tem esse aspecto.
A primeira tonalidade, vista por um mortal, terá esse
aspecto: tónica azul. Intensidade da tónica, ouro. Pontuação ou duração:
cinza-prateado, mistura de azul cercado de ouro e de cinza-prateado.
Essa primeira tonalidade representa o amor divino.
As outras cores fundamentais apresentam todos os outros sentimentos, indo do
amarelo-claro ao vermelho-escuro, porém essas cores são sempre acompanhadas dos
seus mantos dourados e das suas vestes cinza-prateadas.
Em música humana, acorde perfeito: dó, mi, sol.
Tornando-se o ré acorde perfeito: ré, fá, lá;
com o mi, acorde perfeito: mi, sol, si.
A tónica variará de cor, passando do azul para chegar ao vermelho,
mas as duas outras notas serão sempre ouro e prata; elas nunca
variarão.
Segundo a qualidade do perispírito (i) e a
natureza do campo vibratório, as sensações variam e aumentam de intensidade, a
ponto de se tornarem maravilhosas. Certos perispíritos recebem o amarelo,
outros o vermelho. Existem alguns que excluem esta última cor.
O violeta é menos suportável para os seres evoluídos.
O verde claro é mais agradável que o verde escuro. Pode-se, segundo
as leis do espaço, perceber uma mistura de azul e de rosa.
Os campos vibratórios variam igualmente de intensidade. Eles
resultam de emanações angélicas, inspiradas pelo ser divino. Quando se retorna
à Terra, ainda se está impregnado dessas vibrações; o corpo
material aniquila-as, mas a consciência conserva a sua impressão.
Fora desses campos vibratórios existem esferas, e mesmo correntes, que proporcionam
aos espíritos menos evoluídos prazeres harmónicos às vezes vivos e profundos,
ainda que mais pessoais. Essas correntes fluídicas comunicam ao ser as
alegrias íntimas do amor divino. Outras correntes dão-lhe somente a alegria de
ouvir os acordes da lira celeste. Essas vibrações, não coloridas e invisíveis ao ser desencarnado (i), dão-lhe uma satisfação comparável àquela que a sensação dos perfumes lhe
proporciona.
A música celeste, portanto, é o resultado de
impressões causadas pelas camadas fluídicas de acordo com a
elevação do ser e a pureza do meio.
No espaço não se ouve nada; sente-se a harmonia dos
fluidos e não a dos sons. A propriedade essencial dos fluidos é a cor. O
som é de essência terrestre, a cor é de essência celeste. A próxima lição
tratará dos encantos harmónicos do espaço e da sua persistência nos sentimentos
humanos.”
Espírito Massenet (i)
–
Comentário
A solidariedade dos sons e das cores, da qual nos fala o Espírito Massenet, foi
entrevista por todos os grandes músicos. Um deles disse: “A melodia é para a
luz o que a harmonia é para as cores do prisma, isto é, uma mesma coisa sob
dois aspectos diferentes: melódico e harmónico.”
Platão (iii) dizia
ainda: “A música é uma lei moral. Ela dá uma alma ao Universo, asas ao
pensamento, um impulso à imaginação, um encanto à tristeza, a alegria e a vida
a todas as coisas. Ela é a essência da ordem e eleva em direcção a tudo
o que é bom, justo e belo, de que ela é a forma invisível, porém
surpreendente, apaixonada, eterna.”
De passagem, observemos que Massenet é mais
melodista que sinfonista.
Para formar a luz branca, é necessário o acorde das
cores complementares e esta luz torna-se mais viva e radiosa na mesma proporção
em que a melodia resuma e sintetize melhor o acorde das harmonias
complementares.
Parece, então, que há uma concordância perfeita entre as
concepções dos génios terrestres e o ensino das entidades do Além,
reconhecendo-se que estas nos fornecem detalhes, estimativas ignoradas pelos
especialistas do nosso mundo.
As relações que a melodia e a harmonia têm entre si são
como as que existem entre o pensamento e o gesto. Também se poderia dizer que,
em música, a melodia representa a síntese, e a harmonia, a
análise. Portanto, elas penetram uma na outra e não valem senão quanto mais
completamente se combinem e se liguem.
Na Terra, a beleza de uma obra musical resulta ao mesmo
tempo da concepção e da execução, mas na vida do Além, o pensamento iniciador e
a execução se confundem porque o pensamento comunica às vibrações fluídicas as
qualidades que lhe são próprias. A obra é tão mais bela e a impressão que ela
produz é tão mais viva quanto mais elevada for a intenção. É isso que dá
à prece ardente, o grito da alma em direcção ao seu Criador,
propriedades harmónicas.
Quanto mais nos elevamos na escala das relações, mais a
unidade nos aparece na sua sublime grandeza.
A lei das notações musicais rege todas as coisas e o seu
ritmo embala a vida universal. É uma espécie de geometria radiante e
divina. O alfabeto humano, como que uma gaguez, é uma das suas formas
mais rudimentares. As suas manifestações, porém, tornam-se cada vez mais amplas
e importantes em todos os graus da escala harmónica.
O espírito humano não pode elevar-se até às supremas alturas
da arte cuja fonte está em Deus, mas ele pode, pelo menos, elevar as suas
aspirações em direcção a elas. As concordâncias estéticas dispõem-se,
em graus, ao infinito; mas acontece apenas que se, nas horas de êxtase
e de enlevo, o pensamento humano entrevê alguns aspectos da lei universal da
harmonia. A regra musical produz-se,
no espaço, em traços de luz; o pensamento, a expressão do talento divino e os
astros no seu curso, ali conformam as suas vibrações.
Se o espírito humano, nos seus arrebatamentos, se eleva um
momento sobre essas alturas, ele recai impotente para descrever as suas
belezas; as impressões que ele sente só podem ser traduzidas por uma muda
adoração. O próprio Espírito Massenet se declara insuficientemente evoluído para se manter nessas
esferas superiores.
Uma vez mais, aqui nos encontramos parados pela
impossibilidade de exprimir, numa linguagem humana, ideias sobre-humanas. Ainda
que se possa falar, fica-se sempre abaixo da verdade. O infinito das ideias,
dos quadros, das imagens são como que um desafio dirigido aos recursos
limitados do vocabulário terrestre. Efectivamente, como meter em palavras, como
resumir em palavras todo o esplendor das obras que se desenvolvem nas
profundezas dos céus estrelados?
/…
(ii) Diapasão: pequeno instrumento
metálico que dá uma nota constante, normalmente o lá, e que serve
para se afinarem vozes e instrumentos por ele. (N.T.)
(iii) Platão: célebre filósofo grego
(Atenas, 428 ou 429 - id., 348 ou 347 a.C.), discípulo de Sócrates, mestre
de Aristóteles. Autor dos diálogos: Criton, Fédon, Fedro, Górgias, O
Banquete, A República, As Leis, etc, em que dá a
palavra a Sócrates. (N.T., segundo o Dicionário Koogan Larousse.)
LÉON DENIS, O Espiritismo na Arte, Parte
X Quarta lição do Espírito Massenet – A música humana e
as notas harmónicas – A música celeste – Os sons e as cores – Comentário, 28º
fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: O Concerto dos Anjos (1897), óleo sobre tela de Edgard Maxence)
(imagem de contextualização: O Concerto dos Anjos (1897), óleo sobre tela de Edgard Maxence)