Solidariedade comunhão universal ||
Todos os seres estão ligados uns aos outros e se influenciam
reciprocamente: O Universo inteiro está submetido à lei da solidariedade. Os
mundos nas profundezas do éter, os astros que, a milhares de quilómetros de
distância, entrecruzam os seus raios de prata, conhecem-se, chamam-se e
respondem-se. Uma força, que denominamos atracção, os reúne através dos abismos
do Espaço.
De igual maneira, na escala da vida, todas as Almas estão
unidas por múltiplas relações. A solidariedade que as liga funda-se na identidade
de sua natureza, na igualdade dos seus sofrimentos através dos tempos, na
similitude dos seus destinos e dos seus fins.
A exemplo dos astros dos céus, todas essas Almas se atraem.
A Matéria exerce sobre o Espírito os seus poderes misteriosos. Qual Prometeu sobre a sua
rocha, ela o encadeia aos mundos obscuros. A Alma humana sente todas as
atracções da vida inferior; ao mesmo tempo percebe os chamados do Alto.
Nessa penosa e laboriosa evolução que arrasta os seres, há um facto consolador
sobre o qual é bom insistir: em todos os graus da sua ascensão, a Alma é
atraída, auxiliada, socorrida pelas entidades superiores. Todos os Espíritos em
marcha são auxiliados pelos seus irmãos mais adiantados e devem auxiliar, por
sua vez, todos os que lhes estão abaixo.
Cada individualidade forma um anel da grande cadeia dos
seres. A solidariedade que os liga pode muito bem restringir um tanto a
liberdade de cada um; mas, se esta liberdade é limitada em extensão, não o é na
intensidade.
Por mais limitada que seja a acção do anel, um só dos seus
impulsos pode limitar toda a cadeia.
É maravilhosa essa fecundação constante do mundo inferior
pelo mundo superior. Daí vêm todas as intuições geniais, as inspirações
profundas, as revelações grandiosas. Em todos os tempos, o pensamento elevado
irradiou no cérebro humano. Deus, na sua equidade, nunca recusou o seu socorro
nem a sua luz a raça alguma, a povo algum. A todos tem enviado guias,
missionários, profetas. A verdade é uma e eterna; ela penetra na Humanidade por
irradiações sucessivas, à medida que o nosso entendimento se torna mais apto
para assimilá-la.
Cada revelação nova é continuação da antiga. É este o
carácter do Espiritualismo moderno, que traz um ensino, um conhecimento mais
completo do papel do ser humano, uma revelação dos poderes recônditos que ele
possui e também das suas relações íntimas com o pensamento superior e divino.
O homem, Espírito encarnado, tinha esquecido o seu
verdadeiro papel. Sepultado na matéria, perdia de vista os grandes horizontes
do seu destino; desprezava os meios de desenvolver os seus recursos latentes,
de se tornar mais feliz, tornando-se melhor. A revelação nova lhe vem lembrar
todas essas coisas. Vem despertar as Almas adormecidas, estimular a sua marcha,
provocar a sua elevação. Ela ilumina os recônditos obscuros do nosso ser, diz
as nossas origens e os nossos fins, explica o passado pelo presente e abre um
porvir que temos a liberdade de tornar grande ou miserável, segundo os nossos
actos.
A Alma humana só pode realmente progredir na vida colectiva,
trabalhando em benefício de todos.
Uma das consequências dessa solidariedade que nos liga é que
à vista dos sofrimentos de alguns perturba e altera a serenidade dos outros.
Assim, é preocupação constante dos Espíritos elevados levar
às regiões obscuras, às Almas retardadas nos caminhos da paixão e do erro, as
irradiações do seu pensamento e os transportes do seu amor. Nenhuma Alma pode
perder-se; se todas tiverem sofrido, todas serão salvas. No meio das suas
provas dolorosas, a piedade e o afecto das suas irmãs as enlaçam e as arrastam para
Deus.
Como compreender, com efeito, que os Espíritos radiosos
possam esquecer aqueles que outrora amaram, aqueles que partilharam as suas
alegrias, as suas preocupações, e pensam ainda nas sendas terrestres? A queixa
dos que sofrem, dos que o destino encadeia ainda nos mundos atrasados, chega
até eles e suscita a sua generosa compaixão. Quando um desses apelos
atravessa o Espaço, eles deixam as moradas etéreas para derramar os tesouros da
sua Caridade nos escuros sulcos dos mundos materiais. Qual vibrações de
luz, os transportes do seu amor se propagam na extensão, levando o consolo aos
corações entristecidos, vertendo sobre as chagas humanas o bálsamo da
Esperança.
Muitas vezes, também, durante o sono, as Almas terrestres,
atraídas pelas suas irmãs mais adiantadas, lançam-se com força para as alturas
do Espaço, para se impregnarem dos fluidos vivificantes da pátria eterna. Ali,
Espíritos amigos as cercam e as exortam, reconfortam e acalmam as suas
angústias; em seguida, extinguindo pouco a pouco a luz em torno delas, a fim de
que as pungentes lamentações da separação não as acabrunhem, elas as reconduzem
às fronteiras dos mundos inferiores. O seu despertar é melancólico, mas
agradável, e, embora esquecidas da sua passagem pelas altas regiões, sentem-se
elas reconfortadas e retomam mais alegremente os encargos da sua existência
neste mundo.
/…
Léon Denis, O Grande Enigma, Primeira parte / Deus e o Universo, III Solidariedade
| comunhão universal 2 de 3, 12º fragmento da obra.
(imagem de contextualização: As majestosas e violentas
palavras dos poemas, pintura em acrílico de Costa Brites)
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