Da arte com que trabalharmos o nosso pensamento dependem as nossas misérias ou as nossas glórias...

sábado, 11 de março de 2017

~ em torno do mestre


Educar

Na maneira de conduzir a obra da educação, está a chave do problema cuja solução o momento actual da Humanidade reclama.

Não há duas correntes de opinião, quanto ao valor da educação. Todos a reconhecem e a proclamam como medida salvadora. Porém, há divergência no que respeita ao modo de educar. Existem dois processos de educação: um falso, que mascara a ignorância; outro, verdadeiro, que realmente conduz ao saber. Um, que age de fora para dentro, outro que actua de dentro para fora. Um, artificial, ora maquiavelicamente (i) empregado para confundir; outro, natural, cujo alvo é esclarecer, libertar e aperfeiçoar o homem.

O ensino por autoridade, impondo princípios e doutrinas, avilta o carácter e neutraliza as melhores possibilidades individuais. Cria a domesticidade e a escravatura espiritual, regímen ignóbil onde se estiolam as mais nobres aspirações e onde se oficializam a hipocrisia, o vício e o crime.

O ensino por autoridade é a educação às avessas: oblitera a mente, ofusca a inteligência, ensombra a razão, atrofia a vontade, mecaniza e cristaliza a alma do educando.

O ensino que se funda no processo de despertar os poderes latentes do Espírito é o único que realmente encerra e resolve o problema da educação.

Baseando-se o ensino no apelo constante à razão e ao bom senso, gera-se a confiança própria, estimula-se a vontade, esclarece-se a mente — numa palavra — consegue-se que o educando faça a independência própria em todo o terreno, o que representa a verdadeira nobreza de carácter.

A educação, segundo o processo natural, conduz fatalmente o educando à liberdade, faz dele um homem que pensa, sente e age por conta própria. O educando, orientado como deve de ser, não será um repositório de conhecimentos acumulados na memória; há de ser um poder aquisitivo capaz de se enfronhar prontamente em qualquer assunto ou matéria consoante requeiram as necessidades do momento. Nada o embaraçará, nenhuma pedra de tropeço o mobilizará no carreiro da vida. Não sendo um armazém de teorias e de regras estreitas hauridas de oitiva, é uma potência dinâmica capaz de penetrar todos os meandros do saber e de solucionar os mais intrincados problemas da vida, desde que a questão o afecte e lhe desperte interesse.

A educação normal cria capacidades, enquanto que a artificial gera marionetas que vivem a repetir o que ouvem, sem consciência do que fazem. Tais indivíduos são sempre dependentes, imitadores vulgares, parasitas, estratificados.

A educação real organiza sociedades dignas, onde a ciência, a filosofia, a moral e as artes vicejam francamente sob atmosfera favorável; onde há campo vasto para todas as actividades do Espírito e onde todas as aspirações elevadas da alma encontram possibilidades de realização.

A falsa educação promove conglomerados amorfos de indivíduos incapazes, medíocres em tudo, verdadeiros rebanhos que se agitam monotonamente ao sinal do cajado que os tange segundo alheios caprichos.

A educação, tal como deve de ser, prepara o indivíduo para a vida como realmente ela é: para os destinos altaneiros que Deus concebeu e tracejou para o Espírito. A educação falsa amolda o indivíduo ao sabor de outrem, prepara-o para certas escolas político-sociais ou para servir a determinadas organizações sectárias. Em quaisquer desses meios, a liberdade é um mito em que muito se fala para iludir a boa fé alheia, e onde a escravidão é um facto com todo o seu cortejo de ignomínias.

A submissão incondicional à autoridade, como base de ensino, é ultraje à dignidade humana contra o qual se revolta o nosso século. A geração nova, que ora desponta, jamais poderá tolerá-la, em que pese aos reaccionários e ultramontanos (i) de todos os matizes e calibres.

É tempo de se estabelecer a verdade neste particular de tão subida importância. É preciso salvar o mundo, apontando os meios conducentes à realização desse ideal de amor.

A missão do Espiritismo é educar para salvar. Enquanto este facto não penetrar a mente e o coração da maioria dos espíritas, a luz não estará no velador, e o Paracleto (i) ver-se-á embaraçado na tarefa de reivindicar os direitos do divino Redentor, restaurando o Cristianismo de Jesus, desse Jesus que foi mestre, teve discípulos e proclamou a liberdade do homem mediante a educação racional do Espírito.

Educar: eis o rumo a seguir, o programa do momento.


Jesus, o Mestre

Jesus curou cegos de nascença, surdos-mudos, epilépticos, hidrópicos, doidos e lunáticos, paralíticos, reumáticos e leprosos; sarou, finalmente, enfermos de toda a casta que a ele recorreram em busca do maior bem temporal — a saúde. No entanto, jamais o Senhor pretendeu que o dissessem médico, ou clínico.

Jesus frequentava o templo e as sinagogas onde atendia aos sofredores e ensinava ao povo as verdades eternas, mas nunca se inculcou levita  ou sacerdote.

Jesus predisse com pormenores e particularidades o cerco, a queda e a ruína de Jerusalém; como essa, fez várias outras profecias de alta relevância. Penetrava o íntimo dos homens, devassando-lhes os arcanos mais secretos, porém não consta que pretendesse as prerrogativas de vidente ou de profeta.

Jesus realizou maravilhas, tais como: alimentar mais de cinco mil pessoas com três pães e dois peixes; acalmar a tempestade, impondo inconcebível autoridade às ondas revoltas do oceano. Ressuscitou a filha de Jairo, o filho da viúva de Naim e, também, Lázaro, sendo que este último já estava sepultado havia quatro dias. Transformou a água em vinho nas bodas de Cana da Galileia, e muitos outros prodígios operou não pretendendo, apesar disso que o considerassem milagreiro ou taumaturgo.

Jesus aclarava as páginas escriturísticas, fazendo realçar da letra que mata o espírito que vivifica, mas não se apresentou como exegeta ou, ministro da palavra.

O único título que Jesus reclamou para si, fizesse jus às mais excelentes denominações honoríficas que possamos imaginar, foi o de “mestre”. Esse o título por ele reivindicado, porque realmente Jesus é o Mestre excelso, o Educador incomparável.

A sua fé na obra da redenção humana, mediante o poder incoercível da educação, acordando as energias espirituais, é inabalável, é absoluta. Tão firme é a crença na regeneração dos pecadores, na renovação da nossa vida, que por esse ideal se ofereceu em holocausto.

Educar é redimir (i). O Filho de Deus deu-se em sacrifício pela causa da liberdade humana. A cruz plantada no cimo do Calvário não representa somente a sublime tragédia do amor divino: representa também o símbolo, o atestado da fé viva que Jesus tem na transformação dos corações, na conversão das nossas almas. "Quando eu for levantado no madeiro, atrairei todos a mim..." assegurou ele. Todos, notemos bem; não uma parcela mas a totalidade. Vemos por aí como é radical a sua confiança, a sua crença na reabilitação dos culpados, através da educação.

Sim da educação, dizemos bem, porque só um título Jesus reclamou, chamando-o a si, e o fez sem rodeios sem rebuços, nem perífrases, antes com a máxima franqueza e toda a ênfase: o título de mestre. Dirigindo-se aos seus discípulos, advertiu-os desta maneira: "Um só é o vosso mestre, a saber — o Cristo Portanto, a ninguém mais chameis mestre senão a mim". (Mateus, 23:8.)

Jesus rejeitou o ceptro, o trono, a realeza, alegando que o seu reino não é deste mundo. Dispensando igualmente, a glória e as honras terrenas; um só brasão fez questão de ostentar: ser mestre, ser educador. É significativo!

"Eu sou a luz do mundo, sou a verdade, sou o pão que desceu do céu" — proclamou o Senhor. Esparzir Luzes revelar a verdade, distribuir o pão do Espírito — tal a obra da educação, tal a missão do Redentor da Humanidade.

Que dúvida poderá restar a nós, neo-cristãos, sobre o rumo que deve tomar a nossa actividade, uma vez que o advento do Espiritismo é o do Consolador prometido? Que outra forma poderemos dar ao nosso trabalho, que seja tão eficaz, tão profícua e benéfica à renovação social, como aquela que se prende à educação, no seu sentido lato e amplo?

Trabalhemos, pois, com ardor e entusiasmo pela causa da educação da Humanidade, começando pela infância e pela juventude desta terra de Santa Cruz.
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"Aos que comigo crêem e sentem as revelações do Céu, comprazendo-se em sua doce e encantadora magia, dedico esta obra" Pedro de Camargo “Vinícius”


Pedro de Camargo “Vinícius” (i), Em torno do Mestre, Primeira Parte / Seixos e Gravetos, – Educar, – Jesus, o Mestre, 1º fragmento desta obra.
(imagem de contextualização: Pedro de Camargo “Vinícius”, o homem)

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